LUCAS ALONSO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As três PECs (Propostas de Emenda à Constituição) para a reforma do Estado enviadas pelo governo federal ao Senado em novembro apresentam uma série de erros técnicos, imprecisões e exageros. As impressões são de juristas e professores que se reuniram na quarta-feira (11) em evento promovido pela Faculdade de Direito da USP, com o apoio da Folha de S.Paulo.
Divididos em três mesas de debate, os convidados discutiram as PECs que tratam dos gatilhos para contenção de gastos em caso de emergência fiscal, da avaliação e extinção dos fundos públicos e do chamado pacto federativo. Também foi discutida a reforma administrativa que deve remodelar o funcionalismo público no Brasil, mas que ainda não foi oficialmente apresentada pelo governo.
“Estupraram a Constituição”, disse o professor de direito financeiro da USP Heleno Taveira Torres. Segundo ele, os textos longuíssimos e o uso exagerado de termos ambíguos e contraditórios revelam um conteúdo precário em soluções técnicas.
Para ele, os problemas também estão relacionados ao conteúdo, que agride direitos sociais, como a proposta de somar os pisos que União, estados e municípios têm de destinar a saúde e educação.
Professor de direito público da FGV de São Paulo, Carlos Ari Sundfeld classificou os textos das PECs como uma confusão generalizada. “Não se entende o que está escrito.”
Sundfeld também direcionou críticas ao que já chegou ao conhecimento público sobre a proposta de reforma administrativa. Na visão do jurista, a redução de jornada e salários dos servidores públicos não teeá efeito prático se não vier acompanhada de um sistema eficaz de avaliação de desempenho.
Gustavo Justino de Oliveira, da USP, diz que a reforma administrativa é uma discussão não palatável. “Vamos ver o quanto o obstáculo do corporativismo vai frear essa intenção do Ministério da Economia.”
Outra proposta do governo, de incorporar às cidades vizinhas os municípios com menos de 5.000 habitantes e arrecadação própria menor que 10% da receita total, também foi tema de discussão entre os palestrantes.
“Em vez de forçar que os municípios existam ou deixem de existir por esses critérios frágeis, o melhor seria dizer que os municípios não são entes da Federação”, diz o professor de direito administrativo Fernando Dias Menezes de Almeida, da USP.
A justificativa da sustentabilidade financeira parte de pressuposto equivocado, segundo Fernando Facury Scaff, da USP. “A arrecadação dos municípios, tal como a dos estados, não é só tributária, mas também de receitas transferidas. Os diversos tributos são rateados, direta ou indiretamente, pelos demais entes.”
A amplitude das PECs também foi alvo de críticas. “Uma metralhadora giratória”, definiu Clovis Bueno de Azevedo, professor do Departamento de Gestão Pública da FGV-SP.
O conjunto de propostas faz parte de uma “agenda de comunicação e politicagem” do governo Bolsonaro, de acordo com Marcos Augusto Perez, professor de direito administrativo da USP.
O professor de administração pública Fernando Rezende, da FGV-RJ, comparou a falta de planejamento do governo para adoção de medidas que “botam lenha ou areia na fogueira” à personagem central de “Alice no País das Maravilhas”. “Quando Alice chega no gato socrático e pergunta qual é a saída, o gato responde que a saída depende de para onde você quer ir.”
O evento faz parte de um conjunto de ações da faculdade para estimular a discussão sobre as propostas do governo, diz Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, diretor da faculdade.

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