DANIELLE CASTRO
RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – “Hoje tem café?”, pergunta Alexandre, de 2 anos. Uma voz feminina responde “você quer uva?”. Mas o pequeno diz, indignado: “Não! Quero café! O Alê pode!”.

Publicado há quatro anos, a gravação do bebê que pede café viralizou mais uma vez e já acumula cerca de 8,5 milhões de visualizações. Café e crianças parece ser uma combinação que nunca sai de moda. Mas será que o pequeno acertou quando dizia que podia consumir a bebida? Na verdade, não.

Associações médicas e especialistas dizem que crianças não devem consumir cafeína, embora a idade em que a bebida deva ser evitada por completo seja tema de debate. No caso de lactantes, profissionais da saúde indicam cuidado com a quantidade para evitar intoxicações em bebês, embora casos sejam raros.

Foto: Reprodução

De acordo com a SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), a cafeína não deve ser consumida por crianças de zero a dois anos e precisa ser limitada até o fim da adolescência. Os manuais da entidade indicam que o consumo da substância, seja no café ou em outro alimento, deve ser proibido.

Já a AAP (Academia Americana de Pediatria) é ainda mais radical e defende zero cafeína até os 12 anos.

A AACAP (Academia Americana de Psiquiatria Infantil e Adolescente) publicou em 2020 um guia sobre o tema, no qual informa os pais que a cafeína, nootrópico estimulante presente no café, também compõe outros produtos do cotidiano, como refrigerantes, chás, chocolates, energéticos, isotônicos e suplementos alimentares.

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A instituição declara que não há dose segura testada para menores de 12 anos de idade e aponta que, desta idade até os 18 anos, o limite deve ficar em torno de 100 mg por dia (o equivalente a 355 ml de refrigerante de cola ou uma lata).

A SPSP (Sociedade de Pediatria de São Paulo) declara que produtos estimulantes com cafeína como energéticos devem ser evitados por menores de 18 anos, uma vez que não há estudos sobre a segurança do consumo dessas bebidas nesta faixa etária.

A pediatra e nutróloga Rosana Tumas, presidente do departamento de Nutrição da SPSP, diz que, no caso dos adolescentes, o problema está no consumo excessivo do café e das bebidas cafeinadas, como refrigerantes de cola ou energéticos.

“É preciso ficar atento, pois se consumidos com frequência, mesmo que com moderação, podem aumentar o risco de obesidade, devido ao alto teor de açúcar presente nesses produtos”, destaca.

Enquanto a dose máxima recomendada para o consumo diário de cafeína em adultos é de 400 mg por dia, a de uma pessoa de 13 a 19 anos não deve ultrapassar 100 mg por dia, e a de uma criança de 2 a 12 anos deve ficar no limite de 2 mg por quilo por dia.

Crianças, alerta Turmas, são uma população com maior risco de desenvolver disfunções no ritmo cardíaco secundário devido ao consumo de doses elevadas de cafeína.

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“Os sintomas mais comuns são insônia e ansiedade, mas podem também ocorrer alterações do humor e atenção, além do risco de dependência física”, diz a pediatra. “Algumas pessoas podem ter um risco aumentado de sofrer algum tipo de arritmia, podendo até ser fatal em casos extremos.”

O Projeto de Lei 455/15, em tramitação na Câmara, discute a proibição do comércio de energéticos para menores de 18 anos, mas a legislação atual é regulamentada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

As regras em vigência limitam a quantidades de cafeína em 350 mg por litro em produtos energéticos e exigem um alerta sobre os riscos de seu consumo por grupos sensíveis à substância.

Marina Bortoni, 37, intensivista pediátrica da UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do Hospital das Clínicas de Botucatu, diz que nunca recebeu um caso de intoxicação por cafeína, mas que não é seguro consumir até os 12 anos.

“É cultural da casa. Até oferecer leite com café na mamadeira já vi, mas no hospital a gente orienta a não usar e inclusive não prescreve no lactário”, declara.

A médica reforça que grávidas e lactantes precisam também evitar o consumo em excesso de café e produtos com cafeína para evitar intoxicação em bebês – casos, porém, são raros. A profissional destaca que os jovens são um grupo vulnerável.

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“O cuidado maior é com os adolescentes, porque existem muitos suplementos com cafeína que são vendidos sem receita, além das bebidas energéticas”, pondera Bortoni.

A cafeína pode melhorar a concentração em adultos e crianças, mas também pode gerar insônia, ansiedades, hiperatividade, dores de cabeça, náusea, perda do apetite, gastrite e tremores. Overdose de cafeína pode causar, segundo a AACAP, vômito, pressão alta, coração disparado, arritmia e até a desorientação e alucinação em casos extremos.

A nutricionista Ana Paula Cancio, 31, mestre e doutoranda em alimentação, nutrição e saúde pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), lembra que o metabolismo de crianças e adolescentes é mais rápido e suscetível a déficits nutricionais.

“Até para adultos é importante ficar atento à quantidade de cafeína no dia a dia e juntos às refeições, pois o execrado pode atrapalhar a absorção de alguns nutrientes”, diz Cancio.
Outro problemas associados ao café e aos cafeinados é o prejuízo na absorção do cálcio.

Em 2009, pesquisadores da Universidade do Porto, em Portugal, já estimavam uma perda de 4 mg de cálcio para cada xícara de café consumida, o que atrapalha tanto quem já apresenta perdas ósseas como quem está em fase de crescimento.

“O amadurecimento dos ossos ocorre até os 19 anos de idade. Após essa fase, o corpo apenas retira e repõe cálcio de acordo com as necessidades do metabolismo, mas sem haver aumento da massa ‘estabelecida'”, afirma a nutricionista.

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