LUCAS BOMBANA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Da leva de empresas que fez a abertura de capital (IPO, na sigla em inglês) na Bolsa de Valores brasileira nos últimos anos, a grande maioria não tem conseguido entregar retornos acima da média de mercado aos investidores.

Levantamento da plataforma de dados financeiros TradeMap mostra que, das 85 empresas que abriram o capital na B3 desde 2015, apenas 11, ou 13% do total, conseguiram ter um desempenho acima do índice Ibovespa e do CDI.

A análise compreende o período entre a abertura de capital de cada empresa e o dia 15 de julho de 2022, e não considera companhias que fecharam o capital, foram incorporadas ou se fundiram a outras durante esse período.

No grupo das ações que conseguiu superar os índices de referência de mercado, as empresas de aluguéis de automóveis Movida e Vamos se destacaram à frente das demais, com rentabilidade de 90,50% e 70,31% desde o IPO, respectivamente.

“Ambas do setor de aluguel, uma voltada para caminhões e máquinas e outra para veículos leves, essas empresas se valorizaram em meio à pandemia, quando a falta de semicondutores fez com que os preços dos veículos aumentassem, ocasionando tanto a valorização das frotas como o aumento da demanda por aluguel de equipamentos”, diz Sergio Castro, analista com certificação CNPI do TradeMap.

Em meio à alta na cotação do petróleo no mercado internacional com a retomada da atividade econômica em escala global após a fase mais aguda da pandemia, e, mais recentemente, por conta da Guerra da Ucrânia, as petroleiras PetroReconcavo e 3R Petroleum também se destacaram com desempenho acima da média de mercado ao longo dos últimos meses.

“Entender o contexto financeiro e político em que a empresa está inserida antes de investir recursos em um IPO pode fazer a diferença para minimizar os riscos e maximizar as oportunidades”, diz Castro.

Varejistas e imobiliárias aparecem entre as maiores quedas desde a estreia na Bolsa
Já entre as empresas com as maiores quedas desde a abertura de capital, o setor de varejo é um dos principais destaques, ficando com desempenho bem abaixo do índice Ibovespa, que foi impulsionado pela forte alta na cotação das commodities no mercado internacional.

Os papéis da C&A, por exemplo, acumulam queda de cerca de 85% desde a abertura de capital, em outubro de 2019, contra as perdas de 10% do Ibovespa no mesmo período, enquanto os da plataforma de comércio eletrônico Enjoei afundam 88% desde a estreia na Bolsa, em novembro de 2020, ante a baixa de 4,3% do índice de ações.

Já as ações da rede Burger King, alvo recente de uma investida do fundo árabe Mubadala, recuam 65,8% desde que fez seu IPO, em dezembro de 2017. O Ibovespa sobe 33% no mesmo período.

Coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), Claudia Yoshinaga afirma que, em um cenário de crescimento econômico baixo, com pressão inflacionária e aumento dos juros, empresas voltadas ao consumo e varejo de bens não essenciais acabam figurando entre as mais prejudicadas no momento da compra.

“Tivemos uma perda do poder de consumo da população. Embora a taxa de desemprego venha diminuindo, a grande questão é que a renda que as pessoas estão recebendo se reduziu bastante. Elas estão empregadas, mas, em muitos dos casos, com salários menores do que recebiam no passado”, diz a professora.

Ela acrescenta que a forte entrada de investidores pessoa física na Bolsa ao longo dos últimos anos de juros baixos também ajuda a explicar as quedas acentuadas das ações estreantes, à medida que esse público, ainda menos familiarizado com o mercado de ações, pode ter se assustado com as variações bruscas de preços e vendido em um momento de queda das ações.

“Além disso, as ações estreantes costumam ter uma liquidez menor, o que acaba forçando os investidores a terem de vender com um desconto maior para conseguir achar compradores e assim se desfazer do papel”, diz a especialista.

Sensíveis ao aumento de juros e dos financiamentos imobiliários, construtoras recém-chegadas à Bolsa também estão entre as que mais sofreram desde a sua estreia –as ações da Plano e Plano recuam 73,1% desde o IPO, em setembro de 2020, enquanto o Ibovespa cai 3,1%. Já a Mitre Realty vê seus papéis acumularem desvalorização de 74,7% após a abertura de capital, em fevereiro de 2020, ante a queda de 16,4% do índice de ações.

A empresa de resseguros IRB Brasil, que enfrentou problemas particulares por conta de informações falsas divulgadas pela empresa sobre um investimento do megainvestidor americano Warren Buffett, também aparece entre as maiores quedas desde o IPO –as ações da companhia recuam 71,7% no intervalo de julho de 2017 a julho de 2022, contra a alta de 47,4% do Ibovespa em igual intervalo.

Relação inversa entre quantidade de ofertas e desempenho das ações Os analistas da Guide Investimentos apontam ainda que o elevado número de ofertas nos últimos anos, em especial em 2020 e 2021, contribui para retornos baixos das ações novatas na Bolsa.

“Entre tantas ofertas, a qualidade das empresas apresentou uma maior variação, com empresas que nem lucro haviam obtido à época, e, em sua maioria, a preços acima do que havia sido considerado posteriormente como justo pelo mercado, sendo um exemplo do comportamento típico de momentos de euforia”, apontam os analistas Fernando Siqueira, Rodrigo Crespi e Gabriel Gracia, em relatório sobre a onda recente de IPOs no mercado local.

Segundo os especialistas da Guide, “existe uma clara relação inversa entre a quantidade de ofertas e o desempenho destas ofertas no mercado. Anos com muitas ofertas normalmente geram resultados piores no futuro.”

CBA, Movida, Intelbras e 3R Petroleum estão entre as empresas que fizeram o IPO na Bolsa nos últimos anos com ações descontadas que os analistas da corretora entendem que oferecem boas oportunidades aos investidores. São negócios que “possuem qualidade e estão inseridas em setores com potencial de crescer mais que o PIB”.

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