LUCAS MARCHESINI E THAÍSA OLIVEIRA

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O relator da Reforma Tributária no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), estuda incluir em seu texto a previsão de incentivos tributários para montadoras automotivas de forma atrelada à inovação tecnológica e à transição energética. Segundo ele, parlamentares, estados e o governo federal têm feito sugestões sobre o tema.

O debate é feito enquanto o grupo Stellantis —que reúne as marcas Jeep, Fiat, Citroën, Peugeot e RAM— tem chances de ver seus benefícios no Nordeste, previstos para terminarem em 2025, prorrogados por meio da Reforma Tributária. A possibilidade despertou a fúria dos concorrentes, que não veem justificativa para incentivos a fabricantes já estabelecidas.

“O governo federal está conversando conosco, mas nós estamos construindo um texto que a gente espera poder chegar a um consenso”, afirmou Braga na terça-feira (10). “O que eu defendo é que isso [incentivo para a indústria automotiva] seja para inovação tecnológica, transição energética, descarbonização. E que tenha, obviamente, limitações e travas”, disse o senador.

A discussão atrai o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), interessado em assegurar benefícios para a chinesa BYD após uma negociação para a empresa desembarcar na Bahia. A avaliação é que aprovar a PEC sem essa medida poderia comprometer o acerto, gerar insegurança jurídica e deixar o Brasil “desmoralizado” com a China.

No caso da BYD, as concorrentes têm uma avaliação mais branda porque reconhecem que a empresa é uma entrante no mercado brasileiro e ainda tem como diferencial a inovação tecnológica dos carros elétricos.

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Os regimes automotivos para o Nordeste foram criados em 1997. O principal benefício do programa é a redução de 75% no valor a ser pago em Imposto de Renda.

Os incentivos regionais para o setor já foram alvo de análise de um relatório do TCU (Tribunal de Contas da União) sobre a Reforma Tributária feito a pedido de Braga, que promete usar o documento para subsidiar as decisões.

O relatório afirma que benefícios a montadoras que se instalaram no Norte, no Nordeste e no Centro-Oeste geraram um efeito reduzido e limitado.

Entre os casos analisados pelo TCU, está justamente a instalação da fábrica da atual Stellantis em 2015 na região de Goiana, em Pernambuco. Para fazer o levantamento, o órgão mediu a evolução de indicadores como PIB (Produto Interno Bruto) per capita e proporção de pessoal ocupado.

Para o órgão, houve um impacto significativo da instalação da fábrica na região imediata dos municípios de Goiana e Timbaúba (44 quilômetros distantes um do outro), mas não na chamada Região Intermediária de Recife (que engloba 71 municípios, inclusive os dois).

Ainda de acordo com o estudo, foram gerados 11.258 empregos até 2019 pela instalação da fábrica. Como a renúncia fiscal para o projeto foi de R$ 4,6 bilhões em 2019, o TCU conclui que a política representou um custo mensal de R$ 34,4 mil para cada emprego.

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Os técnicos afirmam que a medida é muito mais cara do que outras políticas públicas —como o Bolsa Família, que paga ao menos R$ 600 ao mês para os beneficiários.
O benefício às montadoras é apenas um dos exemplos reunidos pelo documento, que conclui serem necessários aprimoramentos legais na política de incentivos tributários no país —como a criação de regras de avaliação periódica dos impactos econômicos e sociais das medidas.

O relatório do TCU afirma ainda que as leis que criaram os benefícios regionais não trazem nenhuma demonstração de como os incentivos vão ajudar no cumprimento do objetivo —por exemplo, deixam de detalhar quais os problemas enfrentados, além de suas causas ou efeitos.

“Constatou-se também que a União não sabe que resultados quer atingir com as PADR [programas de incentivo regional], pois essas políticas não dispõem de objetivos, metas, indicadores e prazos concretos, cujos atingimentos sinalizem com segurança que as causas de um problema público são tratadas”, afirma o documento.

Assim, conclui o TCU, as políticas “não estão alicerçadas em teoria clara, nem em modelo lógico que explique como as políticas tratarão um problema público, ao menor custo possível”.

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A Stellantis disse que respeita o relatório do TCU, mas questiona o foco no período desde 2015. “O relatório poderia ter sido mais abrangente e coberto períodos até maiores. Ele é muito focado na Stellantis”, avaliou o diretor de comunicação corporativa da empresa, Fabrício Biondo.

A Stellantis é a maior empresa ainda instalada no Nordeste fruindo do benefício. Outro grupo multinacional que chegou a se instalar na Bahia para ter acesso ao mesmo programa foi a Ford, que construiu uma fábrica em Camaçari (BA) —parada desde 2021.

Biondo contrastou os achados do TCU com outro estudo, produzido pela consultoria Ceplan e pago pela Fiepe (Federação das Indústrias de Pernambuco).

O documento aponta ter havido “fortes impactos tradicionais (no PIB, na renda, no emprego, na educação básica…)”. Além disso, conclui que a instalação da companhia em Pernambuco foi um agente de inovação graças às “relações que estabeleceu, entre outras, com as principais universidades locais”.

O executivo da montadora questiona também os números do TCU quanto ao número de empregos gerados. Isso porque, para ele, é necessário levar em conta também os postos criados a partir da instalação do polo da companhia em Pernambuco.

Nesse cálculo, prosseguiu Biondo, foram 16 mil colaboradores diretos e 60 mil se incluídos os postos indiretos.

 

Foto: Pedro França/Agência Senado

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