Com o objetivo de identificar de que maneira os povos originários amazônicos, no norte do Brasil, enfrentaram a primeira onda da covid-19 antes da chegada da vacina, a pesquisadora Alanna Yara Souza conviveu por cerca de sete meses, entre dezembro de 2020 e julho de 2021, em três tribos indígenas no estado do Acre.

A convivência dela e as experiências durante a pesquisa serão transformados em um documentário que pretende concluir nos próximos meses. Em entrevista à Rede TC de Comunicações, Alanna Yara, que é formada em Direito e pós-graduada em Inovação Social, afirma que o objetivo é entender como os povos encontraram respostas, através da sabedoria dos pajés e por meio da cultura medicinal sagrada deles, para enfrentar a pandemia do novo coronavírus.

De acordo com a pesquisadora, além de identificar como ocorreu o enfrentamento, o documentário pretende dar voz aos povos originários da floresta. “O objetivo é trazer esse foco para a sabedoria indígena que resiste há tanto tempo. Fazer uma aliança entre essa sabedoria e o conhecimento da medicina tradicional. Não para competir ou ser contra a vacina, ao contrário, os povos que entrevistei até o momento foram vacinados. Eles acreditam no conhecimento que têm, mas também confiam e são gratos por terem acesso às vacinas” – afirma.

Segundo ela, é importante compreender essas diferenças para que haja contribuições mútuas em situações futuras. “Esses povos poderiam ter sido dizimados se não tivessem acesso a esse conhecimento ancestral” – analisa, frisando que a vacinação também foi uma importante aliada das tribos no combate à doença.

“A covid é uma relação com a natureza em desequilíbrio e a solução que eles encontraram foi justamente a manutenção equilibrada dessa relação. A proposta é trazer a junção da sabedoria da floresta com a medicina tradicional, ou seja, unir ciência e conhecimento ancestral” – reforça.

 

 

Povos têm soluções diferentes no enfrentamento à pandemia

 

A pesquisadora Alanna relata que no período em que conviveu com os diferentes povos indígenas, teve como base a Aldeia Nova Vida, da etnia Shanenawa, ou Povo do Pássaro Azul, localizada a 30 minutos de barco da cidade de Feijó. No período, gravou entrevistas e produziu farto material fotográfico sob as perspectivas dela.

De acordo com a pesquisadora, cada povo que conheceu mostrou uma solução diferente no enfrentamento à covid. “Todos estavam na floresta e as soluções foram adotadas por meio da relação espiritual dos pajés com a natureza”, enfatiza.

Relata que, na primeira aldeia que visitou ainda em dezembro de 2020, o pajé disse que, por meio do ritual de ayahuasca havia recebido orientações para aplicar o Kambô. “É o veneno de um sapo, um antibiótico natural, a vacina indígena”, ressalta Alanna. “Deveria aplicar em todos da aldeia, além de uma dieta a base de mandioca. Assim ele fez e, segundo o pajé, as pessoas não adoeceram” – complementa.

Em uma outra localidade, o líder da tribo afirmou para a pesquisadora que todos da aldeia adoeceram e, sem saber o que fazer naquele momento, decidiu realizar um ritual com rezas em busca de uma solução. “O ritual apontou para uma árvore específica da qual foi orientado fazer um chá que limparia o pulmão. Ele encontrou a árvore e começou a tratar o povo com esse chá” – detalha.

Já o povo Shanenawa, onde ela passou mais tempo, o pajé relatou que, com exceção das crianças, todos adoeceram. “Eles usaram urucum, jenipapo e outras plantas para fazerem garrafadas, chás, vaporização e banhos”, reforça.

Diante das experiências observadas, Alanna espera que a pesquisa e o documentário possam abrir os olhos das pessoas para enxergarem os povos originários com mais dignidade e respeito. “É preciso dar valor a essa sabedoria porque ela pode nos salvar um dia”.

 

Foto do destaque: Alanna Yara/Divulgação

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