CRISTIANE GERCINA E NATALIE VANZ BETTONI
SÃO PAULO,SP – CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – Com o agendamento de perícias médicas apenas para 2023 em alguns locais do país, o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) voltou a conceder o auxílio-doença sem que o segurado precise passar por exame do instituto, liberando o benefício apenas com a apresentação de atestado médico.

A regra, que passou a valer nesta sexta-feira (29) com a publicação de portaria no Diário Oficial da União regulamentando o tema, já foi utilizada no auge da pandemia de Covid-19 para liberar o auxílio por incapacidade temporária. A medida é temporária e vale apenas em locais onde a espera pelo exame seja superior a 30 dias.

A expectativa com o novo procedimento, segundo o vice-presidente ANPM (Associação Nacional dos Médicos Peritos), Francisco Eduardo Cardoso Alves, é diminuir a fila da perícia pela metade até novembro, com o atendimento de cerca de 500 mil segurados.

“Na verdade, se chegar a 500 mil, é o equivalente ao normal de um mês de trabalho de perícia. Então a ideia é regularizar a fila”, diz ele. A associação, que sempre foi contrária à liberação de benefício sem perícia, não está se opondo à iniciativa, como já fez outras vezes.

A possibilidade de liberação do auxílio-doença sem perícia por parte do INSS já constava na medida provisória 1.113/2022. A portaria regulamenta a MP e tem validade de 30 dias, podendo ser renovada por igual período. O assunto, no entanto, precisa ser debatido pelo Congresso.

O prazo de afastamento do segurado tem de ser de até 90 dias. Além disso, o auxílio sem perícia não vale para benefícios de natureza acidentária, ou seja, que estejam ligados a doença ou acidente de trabalho. Quem já está com perícia marcada também pode optar pela análise documental.

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FILA DE ESPERA ATINGE A 1 MILHÃO

Em maio, conforme a Folha de S.Paulo publicou com exclusividade, o INSS tinha mais de 1 milhão de segurados na fila da perícia médica. O tempo de espera para atendimento, que pode se estender até 2023, foi agravado por fatores como a greve dos peritos médicos, o fechamento das agências durante a pandemia e a falta de servidores com a aposentadoria de boa parte do quadro.

“O INSS não tomou a iniciativa de reposição de funcionários, o concurso público não saiu, e, portanto, há um déficit em funcionários. A fila nacional está muito grande, então é uma medida mitigadora dentro deste cenário para atenuar a situação daqueles que precisam de uma renda enquanto estão incapacitados”, afirma Rômulo Saraiva, advogado especialista em Previdência Social e colunista da Folha de S.Paulo.

A advogada Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), vê a avaliação do direito ao auxílio-doença apenas por meio de documentos como uma saída para amenizar a grande espera pela realização de perícias.

Foto: Rivaldo Gomes/Folhapress

“A situação das perícias presenciais está realmente muito caótica. Tem agências que não têm perícia, agências que não têm perito, pessoas que moram longe, enfim. Então a perícia a distância, ou a não perícia, com base em documentos, é uma alternativa, principalmente nesses casos mais dificultosos.”

Para Roberto de Carvalho Santos, presidente do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), a medida é boa, mas é preciso ter cuidado em caso de negativa do benefício. Segundo ele, não está claro se o segurado que tiver o benefício negado irá receber um laudo com a explicação dos motivos da negativa.

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“A gente fica questionando, nos casos em que o benefício for indeferido, como ele [o segurado] vai poder questionar os argumentos, se não tem parecer conclusivo sobre por quê a perícia foi indeferida”, afirma Santos.

“A própria legislação exige esse parecer conclusivo, do médico, e consequentemente isso impede inclusive um questionamento mais amplo quando a pessoa vai buscar uma ação judicial, já que não poderá caber recurso administrativo, precisa apresentar o parecer médico, e é esse parecer médico que será analisado pelo perito oficial”, diz.

COMO SERÁ A LIBERAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA SEM PERÍCIA

Para conseguir o auxílio sem passar pela perícia médica, o segurado doente terá de enviar documentos por meio do aplicativo ou site Meu INSS. A análise incluirá o atestado ou laudo médico legível e sem rasuras, contendo as seguintes informações:
– Nome completo do segurado
– Data de emissão do atestado ou laudo, que deve ser menor do que 30 dias da data de entrada do requerimento
– Informações sobre a doença ou CID (Classificação Internacional de Doenças)
– Assinatura do profissional que emite o documento e carimbo de identificação, com registro do conselho de classe
– Data de início do repouso
– Prazo estimado necessário para recuperação

O tempo de afastamento, nestes casos, é limitado a 90 dias. Quem precisar ficar afastado por prazo maior para a recuperação deverá passar por perícia. Além dos documentos exigidos pela regulamentação, o cidadão também precisa enviar cópia dos documentos pessoais. Basta tirar fotos e anexar no processo.

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Por lei, o INSS tem prazo de até 45 dias para dar uma resposta nos casos de pedidos de auxílio-doença, conforme acordo fechado com o STF (Supremo Tribunal Federal). Caso o órgão demore mais, o trabalhador pode ir à Justiça. Se a resposta for negativa, é possível entrar com recurso administrativo no instituto ou buscar o Judiciário.

Diferentemente do que ocorreu na pandemia, não há limitação de valor para conceder o auxílio sem perícia. Na ocasião, o instituto pagava apenas o valor de um salário mínimo. Se o cidadão tivesse direito a renda maior, deveria agendar uma perícia para que a diferença de valor fosse liberada.

Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Segundo Alves, a função dos peritos médicos será a de analisar os documentos para que não haja fraudes. “A nossa função é de apenas analisar a conformidade do documento, a gente não vai entrar no mérito de se existe incapacidade ou não e não vai emitir juízo de valor sobre o documento trazido pelo segurado.”

O vice-presidente da ANMP diz que a fila varia de acordo com as localidades e que onde há fila até 2023 são locais em que já havia problemas crônicos de agendamento por conta da falta de peritos. “Em São Paulo, por exemplo, o agendamento não está para 2023 ainda. Não está nem para setembro.”

Procurados pela Folha de S.Paulo, o INSS e o Ministério do Trabalho e Previdência não haviam se manifestado até a conclusão deste texto.

 

Foto do destaque: Antonio Cruz-Agência Brasil/Divulgação

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