Por Kissila Mell/ALES.

Em reunião virtual na tarde desta quarta-feira (13) os parlamentares do colegiado de Educação debateram o Projeto de Lei (PL) 197/2020, de autoria do deputado Hudson Leal (Republicanos) com pais, alunos e representantes das instituições de ensino. A matéria dispõe sobre a redução proporcional das mensalidades escolares em no mínimo 30% durante o plano de contingência.

Na reunião, o autor da proposta defendeu o mérito da iniciativa e ainda sustentou a constitucionalidade do PL. “O projeto é constitucional já que o responsável pelo contrato tem o livre arbítrio em escolher a escola que deseja. Dessa forma, trata-se de direito do consumidor assunto para se debater pelo Legislativo”.

Hudson Leal ainda ressaltou a aderência de outros deputados que propuseram emendas ao PL 197/2020 ou projetos semelhantes. “Outros cinco deputados apresentaram emendas, o que corresponde que 1/3 dos parlamentares aderiram à iniciativa. Não queremos o prejuízo de nenhuma escola. Mas na ausência de manifestação de outros órgãos, o Legislativo teve que assumir a responsabilidade”, pontuou.

Enivaldo dos Anjos (PSD), autor de um projeto similar apensado ao de Hudson, defendeu a necessidade de encontrar uma decisão favorável às instituições de ensino e aos pais dos alunos. “A Assembleia Legislativa não quer derrubar escolas e nem ficar a favor de grupo de alunos. Somos intermediários de um possível entendimento favorável a todos. Não queremos punir, queremos discutir a solução. Me chama a atenção que as escolas de Medicina não querem fornecer descontos. A Emescam, por exemplo, quer dar apenas 5% de desconto sem uma justificativa plausível, sendo que tem uma alta receita”.

O Delegado Lorenzo Pazolini (Republicanos) foi outro que defendeu a constitucionalidade da matéria ao citar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adi) 3.874 do Supremo Tribunal Federal. Mas ressaltou algumas lacunas existentes no PL 197/2020. De acordo com Pazolini, ao conceder desconto nas mensalidades é necessário observar a proporcionalidade entre as unidades de ensino. “Não é possível equiparar uma creche com uma instituição de ensino superior”. A manifestação recebeu apoio do presidente da comissão, Vandinho Leite (PSDB).

Pazolini ainda chamou atenção para o parágrafo único do artigo 4º do PL. De acordo com o deputado, o parágrafo desnatura o texto inteiro da lei, tornando-a inócua e prejudicando seus efeitos práticos, uma vez que possibilita que as instituições de ensino adotem um percentual menor que 30%, desde que comprovem os custos por meio de planilha. “Neste parágrafo estamos concedendo o benefício com uma mão e suprimindo o direito com duas”, defendeu.

Já o deputado Sergio Majeski (PSB) se posicionou contrário ao projeto em debate. “Continuo preocupado com o PL 197. Concordo que todos têm parcial razão. Mas continuo achando que é um projeto inconstitucional. Se podemos legislar sobre esse tema, também podemos legislar sobre planos de saúde. Fico preocupado em estarmos criando falsas esperanças aos capixabas”.

O parlamentar, que é professor, ainda destacou algumas dúvidas em relação à proposta. “Supondo que pudéssemos legislar sobre o tema, o projeto ainda apresenta uma série de incógnitas. Colocar escolas de Medicina no mesmo patamar de creches? Também é incoerente colocar ensino médio e fundamental no mesmo patamar de ensino superior”, avaliou.

Ele continuou: “O projeto apresenta uma série de lacunas como se todas as instituições estivessem no mesmo nível, como se o que fosse oferecido tivesse a mesma qualidade no serviço. Outro ponto, para fechar um ano letivo é necessário um número x de horas-aulas. Supondo que as escolas voltem em setembro e tenham reposições. Como as escolas vão pagar essas horas extras se não têm caixa?”, indagou.

Dary Pagung (PSB) e Dr. Emílio Mameri (PSDB) também defenderam a proporcionalidade e o escalonamento ao conceder os descontos nas mensalidades. Entretanto, Dary Pagung, líder do governo, se mostrou preocupado com as possíveis demissões que ocorrerão principalmente em escolas de menor porte.

Mameri cobrou celeridade no debate. “O projeto precisa ser melhorado. Mas precisamos de uma certa agilidade por conta do desespero dos alunos. Necessitamos de aprovar um projeto que atenda a todos”, concluiu Dr. Emílio.

No momento de ouvir os convidados, a representante de pais de alunos de escolas particulares, Erica Castro, falou da dificuldade que os pais estão enfrentando para manter as altas mensalidade das escolas dos filhos em momento de diminuição de renda e também se queixou da dificuldade em fazer um acordo com as instituições de ensino. “O Darwin não está aberto para uma negociação e até o momento não concedeu desconto”.

O Superintendente do Sesi no Espírito Santo, Mateus Simões de Freitas, se mostrou preocupado com a redução das mensalidades visto que a rede de ensino Sesi e Senai são instituições sem fins lucrativos e já tiveram uma queda de 20% de sua receita.

“O projeto nos preocupa porque pode acarretar o fechamento de muitas unidades, já que nossas receitas são subsidiadas. Ademais, 84% de nossas despesas já estão comprometidas com folha de pagamento e material didático para mantermos nossa operação. Não sei como faríamos para manter nossa operação. Até porque estamos preparando aulas online de ponta com a mesma carga horária”, explicou Mateus.

O presidente do Sindicato dos Professores de Escolas Particulares do Estado do Espírito Santo (Sinpro), Juliano Pavesi Peixoto, também se mostrou preocupado com o projeto de lei e com as consequências que poderão repercutir em todos os trabalhadores que movimentam uma escola.

“Quando se fecha uma escola, uma gama de trabalhadores e serviços se encerram também. Nem todas as instituições estão sendo beneficiadas com programas do governo. Muitas nem podem se comprometer com empréstimos. Não é possível tratar todos de forma linear”.

Representando os alunos, o estudante Thales Henrique Alves Pereira, Presidente da Associação dos Estudantes de Medicina do Espírito Santo, também se queixou da dificuldade que os pais estão encontrando em pagar mensalidades – que giram em torno de R$ 9 mil.

“Nossas famílias estão sofrendo para manter as mensalidades, precisamos que o desconto seja dado o mais rápido possível ou muitos abandonarão o curso. Até o momento, a Emescam concedeu apenas 5% de desconto e não estão abertos à negociação. Além do que, esse desconto já era praticado para quem adiantasse o pagamento das mensalidades. Não foi aplicado por conta da pandemia. Além disso, a mensalidade aumenta todos os anos indiscriminadamente. Nosso receio é de que utilizem esse desconto de 30% para aumentarem as mensalidades de forma desproporcional posteriormente”.

O deputado Enivaldo dos Anjos aproveitou o debate e defendeu que seja aberta uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar essas instituições.

“Observo as discussões em nome de reconhecer os direitos dos estudantes nesse momento. Agora minha guerra é também contra as faculdades de Medicina. País que precisa de médicos e cobram uma mensalidade de R$ 9 mil e R$ 10mil. Independente da condução desse projeto proponho uma CPI para apurar as condições das faculdades de Medicina do Espírito Santo. Absurdo essas mensalidades sendo que são instituições de concessão de serviço público. Isso é uma verdadeira opressão financeira”, criticou o parlamentar.

Em consonância com o que defendeu Enivaldo, o deputado Hudson Leal, que é médico, disse que também vai denunciar aos órgãos competentes uma possível cartelização dos empresários das escolas de Medicina.

Outro convidado que participou do debate foi o presidente do Sindicato das Empresas Particulares de Ensino (Sinep-ES), Moacir Lellis. “As escolas estão fechadas não é porque queremos. Desde o início a orientação é de que as escolas funcionem com o mínimo. Atualmente a inadimplência já era de 30% na educação básica e de 40% no ensino superior. Também temos a preocupação em manter a empregabilidade. Se as escolas deixarem de existir depois que a pandemia passar eu pergunto: para onde irão cerca de 30 mil alunos? Estamos trabalhando em favor das negociações e mediações. O sindicato, o Ministério Público, o Tribunal de Justiça e o Procon estão juntos procurando uma mediação com cada demanda que chega”.

O advogado Francinaldo Santos, também representando os pais de alunos, questionou sobre a qualidade do ensino que está sendo oferecido através do ensino a distância.

“Tem se falado dos custos, dos valores das mensalidades, das demissões, mas não estão discutindo a qualidade desse ensino. Ademais, até agora o consumidor tem financiado o risco da escola. Estamos sendo obrigados a pagar integralmente e ainda fazer o trabalho de dar aula aos nossos filhos. Escola alega que vai conseguir reposição das aulas. Como podem garantir? Existe um desequilíbrio contratual e vejo uma obrigação de renegociar”.

A convidada Barbara Campos, pedagoga e representante do Grupo de Apoio de Pais de Autistas, demonstrou a preocupação com a situação dos professores, com os profissionais da administração, da equipe de limpeza e ainda e com a sobrecarga dos alunos com o conteúdo online, sobretudo os alunos especiais que necessitam de material didático diferenciado.

Outro pai que questionou sobre a qualidade do ensino ofertado e sobre a resistência das escolas em conceder desconto foi Marcelo Alvarenga. “Precisamos ter uma percepção do real momento que estamos vivendo. Fala-se muito da questão do desconto. Outra parte do debate é a qualidade do ensino. A verdade é que todos os setores da sociedade foram afetados com essa pandemia. Precisamos de um instinto de cooperação mútua para sobrevivermos esse momento. Inadmissível que não pare para um diálogo. Se não houver uma cooperação não chegaremos a um bom termo. A questão não é de mero cunho financeira e econômica, mas de sobrevivência”, lamentou Marcelo.

Ao final do debate, que durou cerca de 3h30, o presidente Vandinho Leite ressaltou a necessidade de se avaliar os pontos discutidos e os casos apresentados. O relatório com o resultado da primeira reunião virtual realizada por colegiado da Assembleia Legislativa (Ales) será apresentado em sessão virtual extraordinária da Comissão de Educação na próxima segunda-feira (18), às 11 horas.

Antes de chegar à Comissão de Educação, a matéria foi aprovada em Justiça com parecer que mantém o desconto de 30%. O PL 197/2020 tramitou junto com proposições de outros deputados e recebeu uma emenda substitutiva.

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