Como no alto de uma janela, assim, no Dia de Finados deslumbramos “o maior enigma da condição humana”, a morte. O Filho de Deus, Jesus Cristo, voluntariamente, se submeteu a ela para acabar com ela, transformando a morte em vida e vida em plenitude; em “páscoa”, em passagem da vida terrena para uma qualidade de vida infinitamente superior, eterna e de plena comunhão com o Pai. Paulo a considera um “lucro”; São Francisco de Assis a chama de “irmã”; os Santos, como um anjo com na mão uma “chave de ouro”, ou um ”pedágio” a pagar para entrar na morada de Deus; os místicos, em “novo e definitivo nascimento”.

Deus, “amigo da vida”, criou o ser humano e lhe partilhou a sua divindade e imortalidade: “A vida – canta a Igreja neste dia – não é tirada, mas transformada e, desfeita a tenda do nosso exílio terreno, nos é dada uma mansão eterna”. A morte revela o verdadeiro sentido da vida: o último dia ilumina todos os dias da nossa vida, vigília de uma grande festa. Ela ganha em profundidade na medida em que descobrirmos que a nossa vocação última e definitiva é a comunhão com Deus, Uno e Trino.

A religião cristã celebra a vida não a morte: “A fé cristã – diz o Concílio – oferece a possibilidade de uma comunhão com nossos irmãos falecidos, dando-nos a esperança de que eles já possuem em Deus a vida verdadeira” (GS 18,2). A esperança cristã de ressurreição e vida se fundamenta na Ressurreição de Jesus: “O Espírito de Deus, que ressuscitou Jesus Cristo dos mortos, dará, também, vida aos nossos corpos mortais, porque este mesmo Espírito habita em nós” (Rm 8,11). Este encontro com Ele pede correspondência na vivência do amor e na gratuidade do nosso serviço fraterno.

Vigilância e mortificação caracterizam, com efeito, nossa vida terrena: vigilância, que não é simples espera, passiva e alienada, mas é disponibilidade em fazer o bem e coragem em lutar para que as sementes do Reino, lançadas por Cristo, cresçam em nossa vida e na vida do mundo. Mortificação: é viver na sobriedade e no desprendimento, engajando-se na luta, ao lado dos empobrecidos, a favor da vida negada, ameaçada e sofrida; é se opor a toda estrutura de opressão e de morte, para construir um mundo mais humano, justo e solidário

Nossa fé proclama: “Creio na Ressurreição dos mortos; creio na vida eterna”. E, com Jó: ”Eu sei que o meu Redentor vive e, depois de que esta minha pele será destruída, na minha carne verei a Deus”. Com minha carne –e não sem ela– verei a Deus. Também, o nosso corpo –sepultado corruptível, no final dos tempos, ressuscitará incorruptível– para participar da plena comunhão de vida com Deus e os seus Santos, pois a dignidade da pessoa humana está a fundamento da imortalidade de todo o nosso ser, corpo e alma. Quem for capaz de doar a sua própria vida, servindo a todos com generosidade e perseverança, será servido pelo próprio Cristo no banquete eterno.

 

(*Padre Ernesto Ascione é missionário comboniano e vigário cooperador da paróquia São José, Serra-ES.)

 

Foto do destaque: TC Digital/Arquivo

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