CLAYTON CASTELANI E STEFHANIE PIOVEZAN

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ritmo de envelhecimento da população brasileira será semelhante ao registrado no Japão, considerado o primeiro país a ter uma alta proporção de idosos.

A taxa de pessoas com 65 anos ou mais no país asiático avançou de 7% em 1971 para 28% em 2019 –um intervalo de 48 anos, portanto. No caso do Brasil, a expectativa é que isso ocorra em um período semelhante. O país atingiu a taxa de 7% em 2012, e a previsão é que chegue a 28% em 2062. Trajetória semelhante a da China, que começou a envelhecer em 2001 e chegará ao topo em 2053.

Recorte por idade e sexto do Censo Demográfico 2022 divulgado na última sexta-feira (27) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontou que 10,9% dos brasileiros residentes possuem 65 anos ou mais. Considerando o total de habitantes no país, dos 203,1 milhões de brasileiros, 22,2 milhões estão nesta faixa etária.

Crises econômicas, alterações no mercado de trabalho, mudanças culturais, avanços tecnológicos e catástrofes se entrelaçam na trama que resume à causa básica do envelhecimento brasileiro e mundial: as mulheres têm cada vez menos filhos, explica o sociólogo José Eustáquio Diniz Alves, pesquisador aposentado do IBGE.

Com base em estimativas populacionais da ONU, Alves compara a velocidade da mudança no perfil etário brasileiro com a de algumas das principais economias mundiais.
Se por um lado o Brasil copia potencias asiáticas ao apartar o passo da mudança da sua estrutura etária, por outro, os dados também mostram que potências europeias e os Estados Unidos envelhecem mais devagar.

Primeiro país a atingir a marca de 7% de maiores de 65 anos, em 1870, a França só irá quadruplicar o seu percentual de idosos em 2074, mais de uma década depois do Brasil. Os franceses levarão 204 anos para que seu maior grupo etário seja dessa faixa etária, enquanto os brasileiros percorrerão esse caminho em 50 anos.

Envelhecendo desde o final da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos irão demorar 157 anos para chegar à marca de 28% de idosos, no ano de 2102.
A questão que se impõe diante da ascensão dos dos grupos populacionais com mais idade é o porquê da queda global da fecundidade, embora em ritmos distintos nas diferentes partes do globo.

Apesar das especificidades de cada país, o acesso das mulheres à educação, mercado de trabalho e métodos contraceptivos são determinantes em praticamente todos os casos, segundo Alves. A transformação do ambiente rural em urbano e a velocidade em que essa mudança ocorre também não devem ser desprezados.

“As pessoas ficaram espantadas quando os dados do IBGE divulgados na semana passada mostraram que o Brasil está envelhecendo rápido, mas os demógrafos sabem disso desde o início dos anos 1970, quando a fecundidade começou a cair de forma mais significativa”, afirma Alves.

O demógrafo também explica que é mínima a chance de mudança no curso do envelhecimento brasileiro e mundial. “É inexorável, seguirá seu curso, talvez um pouco mais rápido, talvez um pouco mais devagar”, diz. “A demografia é como um transatlântico: a rota pode ser alterada, mas de forma muito lenta. É diferente da economia, que que faz curvas rápidas como as de um jet ski”, compara.

Questões migratórias também estão entre fatores que podem influenciar a questão etária. Parte do retardo do envelhecimento da França está relacionado à quantidade de jovens adultos africanos que ingressam no pais em busca de oportunidades de trabalho. Não é o único fator, pois o país também adotou políticas para estimular mulheres a terem filhos.

Catástrofes também pesam nas alterações etárias. Alves destaca que o Japão passou a apresentar queda nos índices de fecundidade após ser atingido pelas bombas atômicas americanas. Decisões governamentais são outro ponto a ser considerado. Um exemplo disso é a política chinesa de filho único por casal, que contribuiu significativamente para colocar o país no ritmo do envelhecimento.

‘O envelhecimento não é uma bomba-relógio’, diz médico

O rápido envelhecimento da população brasileira apontado pelo Censo 2022 suscita reflexões e confere urgência a uma série de desafios, a começar pelo entendimento do termo.

“Não podemos pensar que o envelhecimento é uma bomba-relógio, um peso”, diz o geriatra Milton Crenitte. A sociedade tem de continuar celebrando os anos vividos. É muito bom que as pessoas estejam vivendo mais.”

A mudança no perfil populacional tem impacto na demanda por serviços de saúde, tanto públicos quanto particulares, e por especialistas. De acordo com a AMB (Associação Médica Brasileira), há 2.670 médicos com registro de especialista em geriatria, enquanto na pediatria são 48.654.

“O envelhecimento está ocorrendo mais rápido do que a nossa organização social”, observa Simone Fiebrantz, especialista em gerontologia.

A diferença de compasso tem impacto econômico. Quando o país está no processo de envelhecimento, há um aumento da população economicamente ativa porque a proporção de crianças diminui e ainda não há tantos idosos. Nesse período, há uma redução da razão de dependência, ou seja, há muitas pessoas trabalhando e menos dependentes.

“Foi durante o bônus demográfico que a maioria dos países de alta renda enriqueceu. Eles se tornaram ricos antes de envelhecer e tiveram mais recursos para investir no bem-estar da população”, pondera Cintra. “Com a transição acelerada, o bônus demográfico no Brasil é menor.”

Para André Junqueira, ex-presidente da ANCP (Associação Nacional de Cuidados Paliativos), as experiências europeias ensinam a considerar a população idosa como parte ativa da sociedade e também a preparar as futuras gerações para uma nova visão.

“A ideia de se aposentar com 65 anos, ficar em casa e ter o suporte da família para suas necessidades é um modelo tradicional, mas incompatível com o futuro”, afirma Junqueira.

Foto do destaque: Marcelo Camargo/Agência Brasil

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