Preocupado com os impactos dos prejuízos registrados em São Mateus originados nos resíduos que vazaram de barragens da mineradora Samarco, o vereador Adeci de Sena conclama uma força-tarefa para buscar a reparação coletiva desses danos. A tragédia ambiental, a maior do Brasil segundo o Ministério Público Federal, aconteceu na barragem de Fundão, em Mariana, Minas Gerais, no dia 15 de novembro de 2015.

Conforme destaca a Secretaria de Comunicação da Câmara Municipal, em pronunciamento na sessão desta semana, Adeci apresentou imagens chocantes de peixes com suspeitas de mutação genética em águas litorâneas do Município, inclusive do Rio Cricaré, e de municípios vizinhos na costa capixaba. Também apresentou imagens de ferimentos na pele de ribeirinhos que moram no Distrito de Nativo de Barra Nova.

O presidente da Câmara, vereador Paulo Fundão, afirmou ter recebido um estudo feito pela Secretaria Municipal de Saúde que indica prejuízos coletivos que podem chegar a R$ 1 bilhão em São Mateus.

O relato de Adeci faz parte de um levantamento que preparou para ser apresentado durante a Audiência Regional do Tribunal Popular das Regiões Sul e Sudeste, que começou nesta quinta-feira (18) e segue até sábado (20), em Jacaraípe, Serra.

O vereador Adeci de Sena afirmou que, direta ou indiretamente, os mateenses convivem com a contaminação de águas e também de peixes e outros frutos do mar.
Foto: Secom-CMSM/Divulgação

De acordo com o presidente da Federação das Associações de Pescadores Profissionais, Artesanais e Aquicultores do Espírito Santo, Manoel Bueno dos Santos, “o encontro tem como objetivo discutir as questões socioambientais das regiões Sul e Sudeste e os impactos diretamente na vida e no trabalho dos pescadores e das pescadoras artesanais”. Posteriormente, o resultado desse tribunal regional deve ser levado a Brasília (DF).

 

“Estou todo contaminado. Eu, a minha família”

 

São Mateus – Na apresentação aos colegas vereadores, Adeci disse que a chegada da pluma de rejeitos de minérios trouxe grandes prejuízos coletivos a todos os mateenses, e não apenas aos ribeirinhos, principalmente pescadores e aquicultores. “Estou todo contaminado. Eu, a minha família. Tenho laudos em mãos. Todos nós estamos contaminados” – disse Adeci.

Residente na localidade de Campo Grande, ele salientou que, direta ou indiretamente, os mateenses convivem com a contaminação de águas e também de peixes e outros frutos do mar. Adeci entende que é preciso buscar também profissionais de saúde preparados para diagnóstico especializado nos atendimentos no Hospital Estadual Roberto Silvares e no Pronto Atendimento 24 horas da Prefeitura. “Não podemos baixar a cabeça”, adverte.

Ao recordar que já havia dito que o pior estava por vir, Adeci disse que São Mateus deve estar unido nesta luta pela reparação coletiva, mobilizando vereadores, o Poder Executivo Municipal e outras instituições, como o Governo do Estado e o Ministério Público. “Vamos chamar todos os secretários envolvidos”.

 

Vereadores apoiam causa

O vereador Cristiano Balanga parabenizou a luta travada por Adeci em busca de reparação coletiva para São Mateus. “Você está mostrando que os peixes estão morrendo. Se tiver que rodar o Brasil para denunciar essa situação, rode, meu amigo”, disse o líder do prefeito na Câmara. Balanga disse ainda que é preciso levar a situação ao conhecimento de Daniel Santana e do secretário municipal de Meio Ambiente, Ricardo Louzada.

Assustado com as imagens de peixes e ribeirinhos com feridas na pele, e de animais mortos na faixa litorânea, o vereador Delermano Suim, segundo-secretário da Câmara, enfatizou que é preciso alertar a Vigilância Sanitária de São Mateus e o Governo do Estado para que se possa apurar os riscos de contaminação com metais pesados oriundos do rompimento de barragens da Samarco.

Segundo ele, análise na água de um poço artesiano no Nativo mostrou contaminação já no lençol freático. De acordo com Delermano, mateenses podem estar tomando água com alumínio, cobre e mercúrio, que são cancerígenos. “Precisamos tomar providências”, conclamou.

A primeira-secretária, Ciety Cerqueira, manifestou tristeza com os impactos ambientais e sociais que atingem São Mateus e o Espírito Santo por conta do vazamento de rejeitos de minérios de barragens da Samarco. De acordo com ela, o resultado é a destruição do maior recurso hídrico dos capixabas, além da morte de comunidades tradicionais e de danos às cidades.

 

Paulo Fundão: “A Samarco tem que pagar pelo dano e pelo mal gerado por erros deles”

 

São Mateus – Os prejuízos da Samarco no Município de São Mateus podem chegar a R$ 1 bilhão. Em extenso estudo elaborado pela Secretaria Municipal de Saúde e enviado ao presidente da Câmara, vereador Paulo Fundão, a conta já está em R$ 914 milhões. E o parlamentar ressalta que essa conta pode aumentar ao incluir novos dados apresentados pelo colega Adeci de Sena.

“A Samarco tem que pagar pelo dano e pelo mal gerado por erros deles”, disse Paulo Fundão. O presidente explicou que, pela complexidade do estudo, a análise ainda precisa ser aprofundada. “É importante pegar esses dados que você tem, Adeci, e enviar ao secretário de Saúde”, comentou.

Presidente da Câmara de São Mateus, Paulo Fundão. Foto: Secom-CMSM/Divulgação

Paulo Fundão quer ampliar o diálogo envolvendo também o Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), o Ministério Público Federal (MPF) e o secretário de Meio Ambiente, “para que possamos buscar o ressarcimento desses prejuízos ao Município de São Mateus referentes a Samarco”.

Adeci de Sena acrescentou que estão sendo reunidas novas provas, por uma comissão de atingidos, e sugeriu ainda atrair pesquisadores e estagiários especializados para elaboração de projetos que minimizem os prejuízos decorrentes da contaminação por rejeitos de minérios escoados das barragens da mineradora Samarco.

 

RENOVA

Em resposta, a Fundação Renova afirma que, “a partir de um relatório produzido ao longo de 3 anos, constatou que não houve impactos ambientais em São Mateus”. E que “o relatório, concluído no primeiro semestre de 2020, realizou uma análise integrada dos mais de 50 estudos de referência na região”.

“A conclusão desse relatório apontou que não houve alcance da pluma de rejeitos e não há evidências de elementos técnicos que indiquem a ocorrência de impacto ambiental, causado pelo rompimento da barragem nos municípios de São Mateus e Conceição da Barra, municípios estes que fazem parte dos indicados pela Deliberação CIF n°58 (As chamadas Novas Áreas)” – conclui.

 

ENTENDA O DESASTRE

No dia 5 de novembro de 2015, aproximadamente às 15h30, aconteceu o rompimento da barragem de Fundão, situada no Complexo Industrial de Germano, no Município de Mariana (MG). Além do desastre ambiental, a tragédia ceifou a vida de 19 pessoas.

O empreendimento, sob a gestão da Samarco Mineração S/A, empresa controlada pela Vale S/A e BHP Billinton, estava localizado na Bacia do Rio Gualaxo do Norte, afluente do Rio do Carmo, que é afluente do Rio Doce.

O colapso da estrutura da barragem do Fundão ocasionou o extravasamento imediato de aproximadamente 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro e sílica, entre outros particulados, outros 16 milhões de metros cúbicos continuaram escoando lentamente. O material liberado logo após o rompimento formou uma grande onda de rejeitos, atingindo a barragem de Santarém, localizada a jusante, erodindo parcialmente a região superior do maciço da estrutura e galgando o seu dique, após incorporar volumes de água e rejeitos não estimados que ali se encontravam acumulados.

Em sua rota de destruição, à semelhança de uma avalanche de grandes proporções, com alta velocidade e energia, a onda de rejeitos atingiu o Córrego de Fundão e o Córrego Santarém, destruindo suas calhas e seus cursos naturais. Em seguida, soterrou grande parte do Subdistrito de Bento Rodrigues, localizado a 6 km da barragem de Santarém, dizimando 19 vidas e desalojando várias famílias. Já na calha do Rio Gualaxo do Norte, a avalanche de rejeitos percorreu 55 km até desaguar no Rio do Carmo, atingindo diretamente várias localidades rurais, como as comunidades de Paracatu de Baixo, Camargos, Águas Claras, Pedras, Ponte do Gama, Gesteira, além dos municípios mineiros de Barra Longa, Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado.

No trecho entre a barragem de Fundão e a Usina Hidrelétrica Risoleta Neves (também conhecida como UHE Candonga), a passagem da onda de rejeitos ocorreu de forma mais violenta, acarretando o transbordamento de um grande volume de rejeitos para as faixas marginais do Rio Gualaxo do Norte e Rio do Carmo, em enorme desproporção à capacidade normal de drenagem da calha desses corpos hídricos, ocasionando a destruição da cobertura vegetal de vastas áreas ribeirinhas, por meio do arrancamento da vegetação por arraste, inclusive com a remoção da camada superficial do solo. Observou-se, também, nessa área a deposição de rejeitos sobre o leito dos rios e vastas áreas marginais, soterrando a vegetação aquática e terrestre, destruindo habitats e matando animais.

Após percorrer 22 km no Rio do Carmo, a onda de rejeitos alcançou o Rio Doce, deslocando-se pelo seu leito até desaguar no Oceano Atlântico, no dia 21 de novembro de 2015, no distrito de Regência, no município de Linhares (ES).

No trecho entre a UHE Risoleta Neves, no município de Rio Doce (MG), e a foz do Rio Doce, em Linhares (incluindo o ambiente estuarino, costeiro e marinho), o material seguiu preferencialmente pela calha do Rio Doce, provocando uma onda de cheia especialmente em seu trecho médio (desde a confluência do Rio Matipó até a divisa MG/ES), decorrente do aumento do fluxo hídrico gerado pelo rompimento da barragem de Fundão. Esse fenômeno alagou, temporariamente, áreas mais planas das margens, deixando nelas, após a normalização do fluxo, os sedimentos contendo rejeitos de minério. À medida que a onda de rejeitos avançava pela calha do Rio Doce, sua força inicial foi dissipando, gerando, nesse trajeto, danos associados à poluição hídrica, mortandade de animais e à interrupção do abastecimento e distribuição de água em vários municípios, como Governador Valadares (MG), Baixo Guandu (ES) e Colatina (ES).

O maior desastre ambiental do Brasil –e um dos maiores do mundo– provocou danos econômicos, sociais e ambientais graves e tirou a vida de 19 pessoas. Os prejuízos que se viram às primeiras horas e que aumentaram com o passar do tempo, projetam-se mesmo hoje como um devir que não tem tempo certo para findar. Danos contínuos e, em sua maioria, perenes.

Fonte: Ministério Público Federal – Caso Samarco.

 

Foto do destaque: Secom-CMSM/Divulgação

 

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