CATIA SEABRA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Ele já privou da intimidade da família de Jair Bolsonaro.

Serviu ao primogênito, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Destituído da função, teve que se afastar do clã do presidente da República em decorrência das investigações sobre a prática de “rachadinha” no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Esse não é o policial aposentado Fabrício Queiroz, e sim o advogado Frederick Wassef.

Defensor de Jair e de Flávio até a noite de 21 de junho, Wassef teve que abandonar as causas três dias depois de Queiroz ter sido preso em sua propriedade na cidade de Atibaia, no interior paulista.

Desde então, o advogado ganhou holofotes, virou peça central nas desconfianças em torno do papel dos Bolsonaro no refúgio de Queiroz e vem repetindo que é vítima de armação e fake news daqueles que têm como objetivo prejudicar o presidente, a quem diz amar.

Queiroz foi preso em 18 de junho. Na peça em que pediu a prisão, o Ministério Público do Rio apontou indícios de que Wassef teria não apenas abrigado Queiroz, mas também controlado e restringido sua movimentação. Queiroz nunca foi considerado foragido e hoje cumpre prisão domiciliar.

Para muitos um potencial “homem-bomba”, Wassef rechaça essa rotulação e diz que tudo o que fez foi permitir que um simples averiguado, no caso Queiroz, usasse uma de suas casas para escapar de um suposto plano de assassinato e que tivesse paz no tratamento de um câncer.

Na última sexta-feira (10), em um centro comercial a 10 km do Palácio do Planalto, em Brasília, Wassef ziguezagueia ao falar de sua relação com os Bolsonaro.

A pergunta da Folha é sobre por que a família Bolsonaro não teria tomado a iniciativa de acolher Queiroz, já que o considera inocente.

Wassef afirma que, em dezembro de 2018, “quando estoura esse escândalo [da “rachadinha”] e vem a público essa questão, a decisão da família do então presidente eleito foi imediatamente cortar todo e qualquer tipo de relação com o ex-assessor de Flávio”.

“O fato fala por si. A família fez uma opção. Deu o escândalo, eles cortaram relações e falaram: ‘Vamos esperar isso ser apurado. Quando se resolver, [vemos] se volta a falar [com ele]’.”

Queiroz é um policial militar aposentado que atuou como assessor de Flávio de 2007 a 2018. O Ministério Público do Rio afirma que ele atuou como operador financeiro de um esquema de “rachadinha” (devolução de salários) no gabinete de Flávio.

Questionado se atualmente estaria em melhor situação caso repetisse o exemplo dos Bolsonaro, Wassef concorda, aponta suas diferenças com a família e se compara a Queiroz na luta contra o câncer.

“Sim. A diferença entre eu [sic] e a família Bolsonaro é que sou uma pessoa que passou os últimos dez anos sofrendo em hospital, tive quatro cânceres, duas quimioterapias horrorosas. Passei dez anos de muita dor e sofrimento. Sou um ser humano diferente. Tenho uma sensibilidade especial à pauta câncer, saúde, ajuda ao próximo.”

Três minutos depois, instado a explicar qual seria essa diferença com os Bolsonaro, ele se corrige.

“Não falei que sou diferente da família. Sou diferente de todas as pessoas. Quem passou dez anos sofrendo em hospital com quatro tipo de cânceres, viu a morte de perto”¦ Uma pessoa dessa se torna diferente de qualquer pessoa.”

Wassef não para de fumar e demonstra sentimentos conflitantes ao falar de Queiroz. Ele diz que o amigo de Bolsonaro foi no mínimo descuidado ao participar de festas, almoços e levar estranhos para a casa de Atibaia sem o seu conhecimento.

“Se ele [Queiroz] está ali, em busca de paz, privacidade, para cuidar da saúde e não ser um lugar público para que não o assassinem, é óbvio que a pessoa tem que ter o mínimo de bom senso e o mínimo de cuidado. Coisa que ao tudo indica ele não teve.”

Para o ex-advogado de Jair e Flávio, “Queiroz não teve o devido cuidado” ao enviar imagens da casa pelo WhatsApp. Wassef diz que não permitiria que Queiroz ficasse na casa se soubesse dos amigos que levou para lá. Mesmo contrariado, afirma não se arrepender de ter oferecido abrigo ao ex-assessor dos Bolsonaros.

O então advogado do presidente e de Flávio monitorou e controlou a movimentação do ex-assessor, como indicam mensagens apreendidas pelo Ministério Público.

Os promotores que pediram a prisão de Queiroz afirmam que o ex-servidor buscava omitir de Wassef as saídas que fazia do sítio. O MP-RJ diz ainda que o ex-assessor e seus familiares desligavam seus telefones quando se aproximavam da casa, a fim de evitar eventual monitoramento das autoridades policiais.

Mas como Jair e Flávio não sabiam do paradeiro de Queiroz, já que este era amigo de pescaria do presidente e assessorou Flávio por anos na Assembleia do Rio? Queiroz e Bolsonaro se conheceram no Exército e são amigos há mais de 30 anos. Foi por meio de Jair que o ex-assessor ingressou no gabinete de Flávio.

“Nunca comuniquei ao presidente nem ao Flávio e tenho meus motivos. Acreditava que, se eu comunicasse ao presidente ou ao seu filho, em algum momento alguém mais poderia saber. Que contaria a alguém mais e colocaria em risco a vida do Queiroz. Se essa informação circulasse, matariam o Queiroz dentro da minha casa e ainda colocariam a culpa em mim.”

Queiroz é apontado como o elo da família Bolsonaro com as milícias do Rio de Janeiro. Foi ele quem indicou para o gabinete de Flávio na Alerj a mãe e a mulher do ex-capitão do Bope e antigo líder da milícia Escritório do Crime, Adriano da Nóbrega, morto em fevereiro deste ano durante operação policial na Bahia.

Segundo mensagens obtidas pela Promotoria, o miliciano ficava com parte do salário obtido pelas duas –não ficou esclarecido, no entanto, o destino dado pela família a esse dinheiro.

Na peça que pediu a prisão de Queiroz, o Ministério Público afirma, ainda, que o ex-assessor mantém influência sobre um grupo paramilitar de Rio das Pedras, na zona oeste do Rio de Janeiro.

Antigo frequentador da residência oficial do presidente da República, o Palácio da Alvorada, Wassef senta-se a uma mesa improvisada em uma praça de alimentação inabitada no Lago Sul, em Brasília.

Com mesas e cadeiras empilhadas ao redor, ele reclama da advogada Karina Kufa, tesoureira da Aliança pelo Brasil, partido que os bolsonaristas patinam para tentar criar para as eleições de 2022.

No dia da prisão de Queiroz, Kufa divulgou nota na qual negava que Wassef advogasse para o presidente. Segundo Wassef, o presidente não sabia dessa nota, não a autorizou e não gostou do conteúdo.

“Disse ao presidente: ‘Essa advogada tem um distúrbio psicólogo sério, mentiu’. Eu disse ao presidente o que iria acontecer. Se concretizou. No dia da prisão do Queiroz, assista ao Jornal Nacional. Fez um capítulo [bloco do telejornal] para falar do Fred e provou que eu era, sim, sempre fui advogado do presidente Bolsonaro.”

Em uma hora e cinco minutos de entrevista, Wassef repete que Queiroz nunca morou em seu escritório, não permaneceu lá mais de um ano e jamais esteve escondido. “Nunca escondi Fabrício Queiroz porque ninguém estava procurando ele. Fez incontáveis viagens de ida e volta. Era um cidadão em trânsito.”

Naquele final de tarde de sexta-feira, o telefone de Wassef toca uma única vez. O advogado diz que, mesmo que Bolsonaro quisesse, não permitiria que o presidente saísse em sua defesa. “Não estou defendendo Queiroz ou Flávio. Estou rebatendo mentiras e fake news imputadas à minha pessoa.”

Sem usar máscara de proteção contra coronavírus, Wassef refuta o rumores de que seja capaz de implodir o governo Bolsonaro.

“Não sou bomba coisa nenhuma. Sou leal, amo o presidente. Se realmente falasse todos os segredos que sei do presidente Bolsonaro, se eu pudesse falar tudo que sei dele, da nossa relação dos últimos seis anos, sabe qual seria a consequência? Bolsonaro eleito em primeiro turno em 2022.”

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