PATRICIA PAMPLONA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ao ritmo de uma marcha rápida, marcado por tambores, batidas de pés, música eletrônica e às vezes até apitos, um grupo de mulheres denuncia a violência de gênero cantando. “O patriarcado é um juiz / Que nos julga por nascer / E nosso castigo / É a violência que não vês.”
A letra é acompanhada por uma coreografia repetida por manifestantes vendadas com um tecido preto. “E a culpa não era minha / Nem onde estava / Nem o que vestia.”
Com um momento emblemático em que as mulheres apontam para a frente e cantam “O estuprador é você”, a intervenção virou hino de protestos contra o feminicídio e a violência contra a mulher ao redor do mundo.
Criada pelo coletivo chileno Las Tesis, a performance começou em Valparaíso, em 20 de novembro. O intuito era estrear no Dia Internacional do Combate à Violência Contra a Mulher, em 25 de novembro, mas elas adiantaram a apresentação devido a denúncias de abusos durante os protestos que tomam as ruas do Chile desde 18 de outubro.
Ao menos 23 pessoas já foram mortas nas manifestações, e o Instituto Nacional de Direitos Humanos aponta cerca de 2.000 feridos. Organizações da saúde afirmam que mais de 280 pessoas tiveram dano ocular grave por disparos de balas de borracha.
Rapidamente, a canção e a coreografia do Las Tesis tomaram o mundo. Em menos de 48 horas, a música foi adaptada para o francês e vista também em Londres, Buenos Aires e Cidade do México. Há ainda vídeos gravados em Sydney, na Austrália, e Madri.
Por trás do coletivo, há quatro mulheres: as artistas Sibila Sotomayor e Dafne Valdés, a desenhista Paula Cometa e a figurinista Lea Cáceres, todas com 31 anos.
“Essa canção chega e se transforma nessa performance a partir de um chamado de diferentes artistas cênicas de Valparaíso para gerar intervenções nas ruas”, afirmou o coletivo em declaração publicada no jornal chileno The Clinic.
Nas redes sociais, o perfil do coletivo viu crescer sua repercussão. Elas passaram de cerca de uma dezena de comentários em publicações anteriores –que falavam de performances e pediam a renúncia do presidente chileno Sebastián Piñera– para centenas nas postagens.
Apesar de se ver apoio massivo de mulheres de todo o mundo, as organizadoras denunciam comentários com ameaças. “A todas as pessoas que incitam ódio em nossas publicações, nos desejam entre outras coisas o estupro e a morte, queremos dizer que não temos medo, agora somos milhares.”
E são, mais precisamente, cerca de 245 mil seguidores. Era esse o alcance almejado pelas criadoras da canção, que tem na base textos da antropóloga feminista argentina Rita Segato.
A professora emérita aposentada da Universidade de Brasília realizou diferentes estudos sobre a violência contra a mulher. Há pesquisa sobre violências contra indígenas e a consequência do cárcere sobre as mulheres.
A popularização da canção ajuda a diminuir a lacuna que normalmente se vê entre a academia e o cotidiano, aproximação que está na essência do Las Tesis. Segundo as idealizadoras, o objetivo é traduzir “teses de autoras feministas em um formato performático com a finalidade de alcançar uma múltipla audiência.”

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