sábado, dezembro 7, 2024
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Série ‘Hebe’ mergulha nos dramas e conflitos pessoais e profissionais da apresentadora

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KARINA MATIAS
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “O que você diria para a Hebe se a encontrasse hoje?” Andrea Beltrão, 56, que dá vida à apresentadora em filme e série sobre a artista, demora alguns segundos para responder à questão. “Daria um abraço apertado, um beijo na boca dela [dar selinhos em seus convidados era uma de suas marcas registradas] e diria para ela fazer campanha pela democracia: Hebe, #Elenão”, afirma a atriz, aos risos.

Minutos depois, Beltrão complementa: “Eu perguntaria se o Golias [1929-2005] era apaixonado por ela…Acho que sim.” As declarações da atriz foram dadas durante entrevista coletiva, por videoconferência, em 20 de julho para divulgação da série “Hebe”, que a Globo transmite a partir da noite desta quinta (30).

Mais do que a imagem da apresentadora alegre, sempre vestida com roupas extravagantes e joias nada discretas, a produção em dez episódios mergulha nos dramas pessoais e profissionais da artista. Para Marco Ricca, que interpreta Lélio Ravagnani, marido de Hebe por quase 30 anos, é como se o público pudesse ver os acontecimentos que marcaram a vida dela pelo “buraco da fechadura”.

Na série, Hebe não é apresentada como uma heroína clássica nem como vilã. Mas como uma mulher complexa, intensa e cheia de contradições. Ao mesmo tempo em que era contra a censura e defensora de pautas progressistas, como os direitos dos homossexuais, se mostrava mais conservadora politicamente -a sua amizade com Paulo Maluf era o principal expoente disso e alvo de muitas críticas.

Idealizadora e roteirista do filme e da série -além de responsável por um documentário que deve ser lançado ainda neste ano- Carolina Kotscho começou a pesquisar sobre a cantora e apresentadora há seis anos e se impressionou ao conhecer mais a fundo a artista. Para ela, é muito significativo que “Hebe” passe neste momento na TV aberta (a série estreou no Globoplay no fim do ano passado), em que diz observar uma tomada de consciência da sociedade, com nomes como o do influenciador Felipe Neto e da cantora Anitta falando sobre política.

“Tem toda a alegria, todo o brilho dela, mas tem uma também uma reflexão que eu acho muito bonita e muito importante da gente fazer agora”, diz Kotscho, destacando que a Hebe sabia do poder e da responsabilidade que era ter um microfone em mãos.

Ela também salienta que a apresentadora sempre valorizou muito o diálogo, mesmo com quem pensasse diferente dela, e como isso tem feito falta atualmente. “De uns anos para cá, ninguém tem dúvida, todo o mundo tem certeza, todo o mundo grita, todo o mundo acusa, todo o mundo segrega. Por que a gente não pode ter dúvida, por que a gente não pode fazer mais perguntas, por que a gente não pode ver qualidades em quem pensa diferente da gente? Ela via”, diz.

O diretor Mauricio Farias confidencia que quando foi chamado por Carolina Kotscho para fazer a cinebiografia e a série da Hebe estranhou. Em sua visão inicial, e cheia de preconceitos, como ele mesmo afirma, Farias diz que não entendia o que poderia ter de interessante para contar sobre a apresentadora. Ao ler o roteiro, porém, tudo mudou. “Fiquei alucinado pela história dela e pelo que Carol enxergou nela.”

Para ele, diante do extremismo que foi tomando conta do Brasil e do mundo, ver como a Hebe era uma pessoa agregadora e incentivadora do diálogo foi “chocante”. “Porque ela não era arrogante, ela não fazia isso de uma maneira que ela constrangia o entrevistado […] Ela usava o diálogo para aprender, para evoluir, para servir de reflexão”, diz.

INTERPRETAÇÃO

“Foi um desespero”, afirma Andrea Beltrão sobre o desafio de interpretar a Hebe. Além das questões práticas como fazer o sotaque paulista de uma mulher vinda do interior do estado (a apresentadora nasceu em Taubaté, e a atriz é carioca), a questão maior para ela era a responsabilidade de dar vida a alguém da estatura de Hebe.

“Não foi nada fácil, é uma pessoa muito famosa, talvez a maior apresentadora do Brasil”, diz. A parceria com Marco Ricca, ator com quem Beltrão já contracenou em vários trabalhos, foi fundamental, especialmente para chegar ao modo como Hebe falava, conta ela.

“A gente teve uma primeira leitura, com o elenco todo, e eu fui fazer o sotaque que eu estava aprendendo há meses. Eu falei e foi aquele silêncio na sala, ninguém comentou muito, e eu pensei: ‘Caramba, bola fora'”, relata Beltrão. Ricca, que é paulistano, foi dando dicas para Beltrão dos “s” e “r” típicos dos moradores das cidades do interior. “Ele me deu uma retaguarda, e muita segurança nesse aspecto da composição de uma paulista como ela era.”

A atriz interpreta Hebe dos 28 anos até o fim da vida. No período anterior retratado apenas na série, quando a apresentadora vem com a família para São Paulo aos 14 anos, o papel é feito pela atriz Valentina Herszage, 22.

Ela acompanhou de perto o trabalho de composição de Beltrão, já que o filme “Hebe – A Estrela do Brasil” (lançado em 2019), foi gravado primeiro. Juntas, as atrizes fizeram uma lista de gestos que seria um ponto em comum nas interpretações, como a forma como a personagem enxugava as lágrimas no canto dos olhos ou pega um bebê no colo.

Para Herszage, um dos desafios de dar vida a Hebe foi fazer a gargalhada da apresentadora. “Eu pensava que os jovens não riam para fora, eu falei: ‘Gente: só adulto ri desse jeito.” Após muita preparação, a atriz dá conta do recado.

Quando Hebe morreu, em 2012, Herszage tinha 14 anos. Por isso, ela conta que conheceu mais sobre a apresentadora ao fazer a série e logo se apaixonou pela coragem da artista.

“Ela tinha uma personalidade tão única e uma força de defender o que ela acredita que me emocionava muito. Até pensei, nossa, talvez isso seja algo que eu tenha que trilhar na minha vida, de conseguir me colocar sem pedir essa permissão para existir, simplesmente existindo”, conta.

Beltrão, que chegou a ir como convidada nos anos 1980 ao programa de Hebe, também afirma ter se encantado pela trajetória da apresentadora, que teve uma infância muito pobre, foi arrimo de família durante muitos anos, sofreu por amor, fez um aborto, foi assediada ao longo da vida, mas não deixou de ter a coragem de ser quem era.

“Mesmo com todos os limites, com as dificuldades todas, as inseguranças, falando muita besteira muitas vezes, errando muito, mas também não tendo vergonha de errar. Uma mulher muito interessante, muito forte”, conclui.

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