FABIANO MAISONNAVE
CAMPO GRANDE, AM (FOLHAPRESS) – Ribeirinhos do rio Abacaxis, no sul do Amazonas, relataram ter encontrado mais três corpos neste domingo (9). A região vive uma onda de violência em meio a uma operação da Polícia Militar para encontrar os responsáveis pelo assassinato de dois policiais.

Os corpos foram fotografados em um trecho do rio Abacaxis habitado pelos índios maraguás. Um dos corpos foi identificado como Vandrelania de Souza Araujo, 34. Ela é moradora da comunidade Monte Horebe, pertencente ao Projeto de Assentamento Agroextrativista Abacaxis 2, do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

Ao menos um dos corpos foi identificado como Vandrelania de Souza Araujo, 34. Ela é moradora da comunidade Monte Horebe, pertencente ao Projeto de Assentamento Agroextrativista Abacaxis 2, do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

De acordo com os ribeirinhos, Araujo, seu marido, Anderson Barbosa Monteiro, 34, e o filho Matheus Cristiano Araujo, 14, foram obrigados a entrar numa lancha da PM na quinta-feira (6), sob o pretexto de servirem de guia aos policiais, enviados de Manaus. Os outros dois corpos são do sexo masculino. Um aparentava ter recebido tiros na cabeça.

A Secretaria de Segurança Pública afirmou que, até o domingo à noite, não tinha informação sobre a descoberta de novos corpos e que “são inverídicas as informações de que a Polícia Militar tenha levado qualquer cidadão à força”.

Agora, já são quatro mortos e um desaparecido desde o início da operação, na terça-feira (4). Na sexta (7), foi encontrado o corpo do indígena mundurucu Josimar Moraes Lopes, 26. Seu irmão, Josivan, 18, não foi localizado.

Segundo os indígenas, os irmãos viajavam na mesma rabeta (barco pequeno) rumo a Nova Olinda do Norte quando cruzaram com uma lancha da PM, na quinta-feira.

“Queria que a polícia fosse homem para dizer: ‘A gente matou por engano’. Foi erro deles entrarem em área indígena, eles não têm autorização”, disse à Folha a cacique mundurucu Alessandra Macedo, 30, da aldeia Laguinho.

A Secretaria de Segurança Pública disse que “a suspeita é que [Lopes] tenha sido assassinado por traficantes da área, ainda sem motivação esclarecida”.

“Indígenas confirmaram à polícia que traficantes locais fugiram, em bando armado, para se esconder dentro das terras indígenas. Esse grupo já cometeu homicídios na cidade, inclusive de indígenas, com requintes de crueldade, e acredita-se que estejam agindo de forma articulada na tentativa de manchar o trabalho realizado pela polícia na área”, diz.

Questionado sobre a presença de PMs no dia e no local onde o mundurucu foi assassinado, a secretaria não respondeu.

Decisão judicial A pedido do Ministério Público Federal e da Defensoria Pública da União, a juíza federal Raffaela de Souza determinou nesta sexta que a Polícia Federal envie um efetivo à região “em face dos potenciais abusos e ilegalidade relatados”.

A magistrada também decidiu que o estado do Amazonas “se abstenha imediatamente impedir a circulação dos povos indígenas e ribeirinhos na região, sob pena de multa diária de R$ 100 mil”.

Moradores ouvidos pela reportagem afirmaram que a PF ainda não havia chegado à região e que a PM continuava bloqueando o acesso às comunidades do rio Abacaxis. A região, entre os municípios de Borba e Nova Olinda do Norte, está a cerca de 150 km em linha reta de Manaus. O acesso é apenas de barco ou avião.

Entre os abusos, os PMs teriam torturado o presidente da Associação Nova Esperança do Rio Abacaxis (Anera), Natanael Campos da Silva. O crime teria ocorrido na presença do comandante da PM do Amazonas, Ayrton Norte.

“Depois me levaram pra um lugar mais afastado e começaram a me bater. Eram uns dez policiais e o comandante lá, assistindo. Pararam um pouco, depois teve outra sessão numa lancha chamada Arafat. Meteram um saco plástico na minha cabeça e me perguntavam quantas pessoas estavam envolvidas. Eles ficavam falando que eu não ia escapar”, disse a liderança à Folha, por telefone.

“As mortes e ferimentos de policiais devem ser investigados exaustivamente, mas essa investigação nunca deveria se transformar em uma forma de aterrorizar as comunidades locais e violar seus direitos”, disse, em nota á imprensa, a diretora da ONG Human Rights Watch para o Brasil, Maria Laura Canineu.

“A Secretaria de Segurança Pública informa que a operação acontece respeitando as leis e que denúncias sobre supostas condutas inadequadas de policiais serão apuradas e, se comprovadas, serão adotadas as medidas cabíveis”, afirmou o órgão, via assessoria de imprensa.

Pescaria ilegal A onda de violência na região teve início em 23 de julho. Nesse dia, o secretário-executivo do Fundo de Proteção Social (FPS) do governo do Amazonas, Saulo Moysés Rezende da Costa, tentou entrar na área do rio Abacaxis para praticar pescaria esportiva sem licença ambiental, em plena epidemia de Covid-19.

Os moradores impediram a pescaria. Em meio ao impasse, Costa foi atingido no dia 24 de julho com um tiro no ombro, causando um ferimento leve.

Em 3 de agosto, uma equipe de policiais militares enviada para investigar o ataque se envolveu em um tiroteio, com dois mortos e dois feridos. A PM acredita que os autores dos disparos sejam traficantes.

As mortes provocaram o envio de mais um reforço policial na semana passada, desta vez liderado pelo comandante Norte, totalizando 50 homens na região. Os policiais mortos pertenciam à Companhia de Operações Especiais (COE), unidade de elite da PM do Amazonas.

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