Por
Claudio Caterinque
Repórter
No Espírito Santo, sete municípios são atendidos pela Companhia Espírito-santense de Saneamento (Cesan) por força de liminar da Justiça, já que não aprovaram, no tempo hábil, a renovação da concessão do serviço com a empresa e nem apresentaram alternativa, como a privatização. Desses, quatro estão localizados na Macrorregião Norte do Estado. São eles: Pinheiros, Ponto Belo, Mucurici e Montanha. Os outros três são os seguintes: Piúma, Presidente Kennedy e Laranja da Terra. A Rede TC de Comunicações ouviu os três prefeitos e a prefeita do norte que relataram as dificuldades encontradas por conta da situação.
Conforme indicam, como não foi feita a renovação da concessão, que deveria ter sido aprovada pelas respectivas Câmaras de Vereadores, a Cesan alega que não pode realizar investimentos nos municípios porque não possui contrato. No entanto, a Companhia continua atuando no abastecimento de água e coleta de esgoto e cobrando pelos serviços por força de liminares. Portanto, os prefeitos afirmam que há localidades em seus territórios que não estão sendo atendidas com abastecimento e com esgoto escoando a céu aberto.
A TC procurou também a Procuradoria Geral do Estado do Espírito Santo (PGE-ES), que explicou que essas sete prefeituras estão em vias de fechar um Termo de Transação. Este recurso tem o objeto de legitimar a operação da Cesan e garantir a manutenção do sistema, segundo a procuradora estadual e corregedora-geral da PGE, Luciana Vieira Merçon, que é a responsável pelo processo.
Ela afirma que o termo está sendo mediado pela Câmara de Prevenção e Resolução Administrativa de Conflitos do Espírito Santo (CPRACES), e deve ser firmado entre municípios e a Cesan, com atuação também da Microrregião de Águas e Esgoto do Estado (MRAE), Agência de Regulação de Serviços Públicos (ARSP) e Ministério Público do Estado (MPES).
Com isso, esse termo, se aceito pelas partes, terá validade de dois anos, segundo a procuradora, até que a MRAE conclua o processo de estruturação da nova delegação dos serviços que será conduzida pelo Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES).
A corregedora-geral Luciana Vieira Merçon detalha que o termo já está revisado pelas procuradorias municipais, pela própria PGE e pela ARSP. “A Cesan está finalizando sua revisão e a assinatura depende apenas dessa diligência, que deve ocorrer em breve”.
Governo do Estado já autorizou contratação do BNDES visando universalizar o saneamento básico
A procuradora-geral Luciana Vieira Merçon lembra que o Governo do Estado já autorizou a contratação do BNDES para auxiliar os municípios a cumprirem a meta de universalizar o saneamento básico. O objetivo é atender o que preconiza o Marco Legal do Saneamento. Ela lembra que já houve, inclusive, uma reunião no Palácio Anchieta no mês de outubro para o anúncio da contratação do Banco.

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“A estruturação tem uma estimativa de duração de 2 anos, nos quais serão realizados diagnósticos e dimensionados os investimentos para que seja realizado o leilão para a delegação dos serviços de água e esgoto. A modelagem, concessão comum, PPP Administrativa ou PPP Patrocinada, será definida pela MRAE quando concluídos os estudos que irão apontar qual é a melhor solução. Além dos 7 municípios sem contrato com a Cesan, os municípios que têm Saaes também serão objeto dos estudos. O contrato com o BNDES será assinado neste mês de novembro” – assegura a procuradora-geral Luciana Veira Merçon.
O QUE DIZEM MINISTÉRIO PÚBLICO E CESAN?
A Reportagem enviou a demanda também para as assessorias de comunicação do Ministério Público Estadual, que atua na defesa dos municípios no acordo, e da Cesan. No entanto, até o fechamento desta matéria, não houve resposta do MPES e nem da Cesan.
Na semana passada, a assessoria da Cesan chegou a enviar resposta, publicada pela TC na matéria que relatou as dificuldades de moradores de Pinheiros, que segundo o prefeito Edilson Monteiro, possui pelo menos dez comunidades que não recebem água tratada da Companhia. Foi feito novo contato com a assessoria da empresa ainda na semana passada, solicitando uma fonte para responder a outros questionamentos, inclusive dos demais municípios que estão na mesma situação.
Porém, não houve mais respostas da Cesan até o fechamento desta matéria. Se houver respostas, também do MPES, uma nova publicação sobre o assunto será feita pela TC.
O QUE DIZ O NOVO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO
A Política Federal de Saneamento Básico foi instituída no Brasil em 2007 por meio da Lei 11.445, de 05 de janeiro de 2007, e atualizada pela Lei 14.026, de 15 de julho de 2020. Elas compõem o Marco Legal do Saneamento, um arcabouço legal, administrativo e regulatório para que todas as esferas de governo (federal, estadual e municipal), órgãos da administração pública e a sociedade civil somem esforços para universalizar a oferta de água potável e a coleta e tratamento de esgoto para toda a população brasileira. Também define diretrizes para limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e das águas pluviais urbanas.
A legislação vigente estipula metas concretas para que seja alcançada a universalização dos serviços de abastecimento de água e de coleta e tratamento de esgoto até 2033, o que significa dizer que, até o final de 2033, 99% da população brasileira deverá ter acesso à água tratada, e 90% à coleta e tratamento do esgoto.
“Só ficamos com o sofrimento”, diz prefeito de Ponto Belo
O prefeito de Ponto Belo, Marcos Coutinho Sant’Aguida do Nascimento, explica que a população do município também está enfrentando dificuldades com o serviço de água e esgoto. Ele afirma que, no município, existem locais com esgoto a céu aberto. O prefeito detalha que a Cesan não realiza investimentos por questões legais de contrato. E diz que a Câmara de Vereadores, além de deixar de aprovar a renovação da concessão do serviço, também não deu sequência a uma alternativa.

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“Ainda que a decisão política da Câmara na época fosse de não renovar, eles estavam até apresentando uma alternativa que não foi feita. Então, só ficamos com o sofrimento. Tem gente sofrendo por uma decisão equivocada do passado” – detalha.
Marcos Coutinho explica porque considera que a decisão dos vereadores na época foi equivocada. “Porque junto com a renovação [da concessão para a Cesan], havia também um compromisso contratual de investimentos progressivos que já previa a universalização do saneamento dentro do prazo de 2033”.
O prefeito afirma que, ainda que a Cesan continue prestando o serviço, ele funciona de maneira precária. “Nesse período, os municípios também não startaram [iniciaram] um novo processo licitatório”.
Segundo o prefeito, atualmente ele busca entendimento para achar uma solução rápida para obras emergenciais e lembra do termo que está sendo articulado com a Companhia, o que acredita ser concluído nos próximos dias. “A gente tem trabalhado nisso desde o início do ano e está muito próximo do desfecho. Temos a sensibilidade do governador Renato Casagrande, do Munir [Abud de Oliveira, presidente da Cesan], porque a empresa topou fazer o acordo, mesmo sem contrato, para que ela possa realizar esses investimentos prioritários até que a gente consiga pôr na rua o processo, que é bem complexo, de escolha da nova prestadora” – complementa.
Dica acredita que Mucurici não aprovou renovação por cálculo político
O prefeito de Mucurici, Adilson Gonçalves Pereira, o Dica, afirma que o serviço de saneamento no município sempre foi executado pela Cesan. “Se existe água e esgoto hoje em Mucurici é porque foi a Cesan”. No entanto, segundo ele, quando a Câmara teve a oportunidade de renovar a concessão, votou contra, apontando ser por cálculo político.

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“Achavam que isso poderia dar algum desgaste político para os vereadores, votar a favor de impostos, essas coisas, apesar de que era uma coisa que até já tinha. E isso traz um dessabor muito grande porque nós não temos hoje nada que possa garantir a concessão. A Cesan permanece atendendo, mas porque houve a judicialização do assunto” – explica.
Segundo Dica, ainda que a Cesan continue atuando no município, por meio uma liminar da Justiça, presta o serviço de forma precária porque não pode investir. “Ela não pode aplicar um centavo em município que não tem a concessão. E aí o que está funcionando é só o abastecimento de água e sem nenhum investimento, e o esgoto é aquele que vai correndo pelos bueiros sem nenhum investimento também”.
Dica afirma ainda que a Cesan continua realizando a manutenção do sistema porque “de toda sorte, recebe pelo serviço, o contribuinte continua pagando a conta de água e a conta de esgoto”.
O prefeito detalha que, com o objetivo de cumprir a meta de universalização do serviço, a Prefeitura deve iniciar em breve estudos para um processo de licitação. “Eu comungo favorável a isso porque quando tem disputa, também tem melhora de qualidade, não é isso? A Cesan é uma empresa muito séria, competente, mas isso não vai impedir que outros concorrentes apareçam para poder também almejar a concessão. E nós vamos receber isso com toda serenidade porque é o princípio de democracia, transparência”.
Prefeita de Montanha afirma ter elaborado plano de saneamento na gestão anterior dela
A prefeita de Montanha, Iracy Baltar, afirma que na gestão anterior dela, encerrada em 2020, foi conduzida no município a elaboração de um plano de saneamento básico. Ela explica que o plano contou com a contribuição da Universidade Federal Fluminense e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), inclusive com audiências públicas para escuta da população. No entanto, aponta que, quando chegou o momento de ser apreciado pela Câmara, foi decretada pandemia por conta da covid-19. “E aí parou tudo. Mas nós deixamos o plano pronto”, diz, afirmando que o plano, posteriormente, teria sido aprovado por meio de decreto.

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Iracy Baltar afirma que, por conta disso, a determinação do Marco Legal do Saneamento para a concessão do serviço não foi cumprida e, consequentemente, não houve renovação do contrato com a Cesan. “Acabou que o plano teve que ser aprovado no final do ano passado porque o Ministério Público notificou a Prefeitura. Então, o que que aconteceu? A Cesan não pôde mais trabalhar conosco da forma que deveria”.
A prefeita afirma ainda que, no último ano do governo anterior dela, a Cesan pretendia investir R$ 22 milhões em Montanha. “Por conta da não aprovação do plano, ela pegou esse dinheiro e dividiu entre Pedro Canário e Boa Esperança porque Montanha não fez o dever de casa. Mas agora está encaminhado. Vamos fazer esse contrato [Termo de Transação Judicial] em juízo para que depois seja feita uma grande licitação”.
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