Um sexênio fascinante (2013-2019), carregado de enormes energias evangélicas a partir dos primeiros sinais (vestes, palavras, a consciência de ser apenas o bispo de Roma, a oração silenciosa na Praça de São Pedro…) até a admissão de muitos cardeais-eleitores de ter experimentado, nesta eleição do Papa, a força prodigiosa do Espírito Santo. Para entender a mudança profunda que este Papa deu início na Igreja, é preciso relembrar o que aconteceu naquela tarde do dia 13 de março, dia de sua eleição: o novo pontífice argentino, “vindo do fim do mundo”, se inclina perante a multidão festante, presente na Praça de São Pedro, abaixa a cabeça e pede a bênção e a oração de todos: o silêncio foi profundo, impressionante e tocante…

A reforma da Igreja, implementada pelo Concílio Vaticano II (1962-1965), encontrou neste gesto de Francisco o seu ponto mais alto e significativo, como também a escolha do nome Francisco, o Santo de Assis, a quem Cristo pediu, estando ele orando na Igrejinha de São Damião, numa visão sobrenatural: “Reconstrói a minha Igreja!”. É o início da derrubada do clericalismo, do muro de demarcação, que se tinha criado, ao longo dos tempos, entre os pastores e o povo santo de Deus.

Começou um novo Pentecostes! Francisco, despojado de toda vontade de dominar e prevalecer, inicia uma nova época, entrevista já por Martinho Lutero, que não conseguiu impô-la senão aos seus seguidores: motivos sociais e políticos daquele tempo abafaram esta visão, como também a atitude de defesa, de hostilidade e de incompreensão por parte da Igreja Católica.

Antônio Rosmini, o santo filósofo trentino, no seu livro As cinco chagas da Igreja viu na separação entre o clero e povo de Deus uma das cinco chagas. Até aquela saudação de Papa Francisco “buona sera” (boa tarde), não era apenas um respeitoso e cordial modo de saudar; expressava já a imagem de uma Igreja “povo de Deus”, preconizada pelo Concílio Vaticano II, e de um pastor com “cheiro de ovelhas”. Algo de semelhante aconteceu na abertura do Concílio Vaticano II, com o “discurso da Lua” do Papa João XXIII, na Praça de São Pedro, naquela “carezza” (carinho) do Papa para o povo levar para os seus entes queridos: às crianças sobretudo, e no convite a “enxugar toda lágrima” de idosos, enfermos e inválidos em suas famílias.

O Papa Francisco não tomou parte do Concílio Vaticano II, nem como bispo, nem como teólogo e, na verdade, pouco fala dele, mas é aquele mais o entendeu e o está realizando, relançando-o de modo original e criativo, a começar pelo ícone de Igreja, samaritana, Igreja hospital de campo, Igreja em saída. Papa Francisco está levando a Igreja para dentro da substância do Evangelho e do mundo moderno. Na Evangelii gaudium –sua primeira carta-encíclica– pediu a todo membro da Igreja a ser criativo e se tornar corresponsável dela em sua caminhada. Todos somos habitados pelo Espírito Santo e enriquecidos de seus dons ministeriais e carismáticos (At 2, 17).

Faz algumas semanas, Papa Francisco visitou os Emirados Árabes. Daqui uns dias irá para o Marrocos. Países inteiramente muçulmanos. Nessas visitas, o Papa proclama com grande coragem a dignidade de todo ser humano, a igualdade entre as pessoas, a liberdade de consciência, a fraternidade universal e a união de todos os povos, raças, civilizações e culturas numa só família, no respeito mútuo e na valorização de cada diferença, pois é o Espírito de Deus que implementa as diferenças para a maior beleza e riqueza da família humana.

No dia 31 de outubro de 2016, inaugurou em Lund (Suécia) o início do quinto centenário da Reforma Luterana (1517-2017), dando assim legitimidade às grandes intuições do frade agostiniano Martinho Lutero: “Solus Christus, sola Fides, sola Scriptura, sola Gratia, soli Deo honor et gloria”. Papa Francisco resumiu todo o Evangelho em três ‘P’: Pão – Palavra – Pobres. Fez da misericórdia o centro de seu ensinamento: inaugurou o Ano da misericórdia. Neste espírito, ele preconizou a abolição da pena de morte nas leis dos Estados: “A misericórdia é o melhor sentimento que possamos experimentar! É a misericórdia que mudará o mundo!”.

Em Lund, convocou todos os cristãos a dar início à Revolução da Ternura. Na Evangelii gaudium (nn.250-255), Papa Francisco mostra de sonhar com uma Igreja que vai ao encontro de todas as culturas e religiões, levando ao mundo, mediante o diálogo inter-religioso e cultural, uma paz estável e duradoura.
Como conclusão do Jubileu da Misericórdia, estabeleceu que cada ano se celebre o Dia Mundial dos Pobres, para recordar a todos os cristãos, sobretudo aos líderes mundiais, a ter um olhar preferencial pelos povos e pelas classes sociais mais pobres e marginalizadas, recordando a promessa do Senhor: “O fizestes a Mim” (Mt 25,45; At 20,35).

Padre Ernesto Ascione
Administrador da Paróquia de Santo Antônio
São Mateus-ES

ENSINAMENTOS DE FRANCISCO

• “Os pobres não são um problema; são a solução. Eles são os mestres que nos ajudam a acolher e viver a essência do Evangelho”

• “Se quisermos tocar o Cristo, é necessário tocar o corpo dos pobres. Naquele corpo ferido e humilhado, está a viva presença dEle. Os pobres e os doentes são a viva imagem de Jesus que sofre”.

• “A fé se faz concreta, ajudando os mais necessitados”.

• “Todos são chamados a ser santos nas ocupações de todos os dias e a santidade consiste não em trabalhar amando, mas, amando, trabalhar”.

• “O campo social e político pertence à essência do compromisso do cristão no mundo”.

• “Sem o Cristo, a vida se torna superficial, vazia e nevrótica”.
“A fé não se propaga por proselitismo, mas pela irradiação do testemunho!”.

• “Quem quiser ter o nome glorioso de cristão deve mudar o seu modo de penar, de querer e de agir e o seu próprio estilo de vida, tendo como ponto de referência a pessoa de Jesus Cristo, único Senhor e Salvador, e não ideologias, ou sistema filosóficos, ou religiosos, ou classistas, nacionalistas, raciais, tribais ou soberanistas”.

• “Fazer o bem. Bendizer. Orar. A recompensa? Ser filhos do Altíssimo!”.

• “Em um mundo no qual existem pobres, que padecem a falta de pão, a riqueza torna-se um pecado”.

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