“O que o pai nos deu, a gente passa aos filhos”. A frase, dita pelo lendário sanfoneiro mateense Luiz Geraldino dos Santos, retrata o desejo dele de passar aos filhos a mesma educação que recebeu dos pais, assim como os orienta que esses valores sejam repassados aos netos. Com a mesma alegria que procurou manter desde o início da vida, há 84 anos, ele recebeu a Rede TC nesta sexta-feira (10) e falou da experiência tanto paternal, mas também como um dos 11 filhos de João Geraldino e Maria Izaurina.
Ele conta que a história de vida dele começou no Nativo. “A criação naquele tempo era pesada. Para passar no meio de quem estivesse conversando, se não pedisse licença, não passava. O pai só bastava olhar. A gente, um pouco mais levado, de vez em quando levava uma surrinha para poder ajeitar. Isso foi importante naquela época. A gente não levou prejuízo, só levou vantagem” – ressaltou.
Luiz Geraldino frisa que o carinho entre familiares sempre foi uma característica, com habituais reuniões aos domingos. E a união que aprendeu em casa, manteve na criação dos próprios filhos. A alegria de Luiz Geraldino é ver a família junta na residência, no Bairro de Fátima. Não deixa de tocar nos encontros as velhas sanfonas, uma dela, a primeira que teve. A alegria no lar também é uma característica herdada. O pai era religioso e, em Dia de São João, realizava festas, oferecendo carne de porco engordado especialmente para a data.
Outros pontos que aprendeu e repassa aos filhos são: tratar os pais e aos mais antigos com respeito, e a todos com igualdade. “O Brasil seria outro”, enfatiza. Com a esposa Rita, Luiz Geraldino teve sete filhos: Maria da Penha (in memorian), Wilmar, Silvana, Andreza, Cláudia, Luiz Carlos e Tiago. Luiz Carlos, que recebeu do pai o aprendizado musical, é zabumbeiro e atua em alguns grupos de forró pé-de-serra.
“A pessoa ganhava pouco, mas dava para viver bem”
Com 84 anos, o pai sanfoneiro Luiz Geraldino lembra que muita coisa mudou desde que mudou para a Cidade, vindo do Nativo, aos 13 anos. Conforme disse, naquela época ganhava-se pouco dinheiro, mas o que recebia “dava para tudo”. Salienta que, nos dias atuais, as pessoas até têm uma remuneração maior, mas despesas com de água, luz e outros gastos ficaram muito caras. “A pessoa ganhava pouco, mas dava para viver bem”, reforça.
O sanfoneiro diz que sempre gostou de diversão e ressalta que, neste quesito, a Cidade atualmente ficou pior. Lembra os bailes que eram realizados em clubes como Aeroclube, Riachuelo, Suco das Flores, Ouro Negro e salão de festa de João Madalena. “O Carnaval pegava fogo”. E uma coisa era certa: “Saía de casa e voltava direitinho, em segurança”.
Luiz Geraldino afirma que começou a ter contato com a música aos 13 anos. Trabalhava no cais do Porto e pedia para experimentar a sanfona com músicos que tocavam em bares, incluindo Vicente Bem-te-vi. A trajetória dele, inclusive, começou num cabaré do Porto e passou pela Lira Mateense. Anos depois, o sanfoneiro acabou sendo o precursor do forró pé-de-serra em Itaúnas.
Além de trabalhar no cais do porto como auxiliar de construção civil, Luiz Geraldino lembra que atuou também em obras importantes na Cidade como a construção do Hospital Maternidade São Mateus e, por 19 anos, na Serraria Cacique.
Psicólogo percebe pais mais presentes
Com 30 anos de experiência, o psicólogo Gerson Abarca percebe uma mudança de perfil dos pais, que avalia ser parcial, no que diz respeito à paternidade. Conforme disse, em outras gerações existia um desejo de ser pai bem definido no mundo masculino, embora observa que havia uma ausência no exercício desta missão, com o homem delegando todos os traços culturais para a mulher. Atualmente, percebe um comportamento melhor, mais presente, em quem demonstra o desejo de ser pai.
Gerson sustenta que, no passado, a paternidade era uma coisa muito relacionada à virilidade masculina, como, por exemplo, ter um primeiro filho homem. “Hoje a gente percebe uma redução do desejo de paternidade, porém aqueles que exercem esse desejo de ser pai já melhoram a postura”, afirma.
O psicólogo entende que os pais atuais, que planejaram a paternidade, dividem mais as tarefas e participam mais intensamente na criação dos filhos. No entanto, reitera que o número de quem deseja ser pai diminuiu, sob o argumento de que o filho dará trabalho, que vai gastar muito. “O homem que tem a condição financeira melhor, foca muito na estabilidade para depois pensar em ser pai”, acrescenta.
Conforme o psicólogo, essa situação leva também a outra questão, que é a paternidade não desejada. Gerson constata que, na clínica psicológica, as mulheres buscam ajuda, às vezes demonstrando não querer um filho justamente pela ausência do desejo do companheiro. “Se eles assumissem mais a gravidez, evitaria o desejo do aborto”, sustenta.
Na atualidade, Gerson frisa que a figura do pai é um elemento exigível para uma sociedade organizada. Entende que a melhor forma de exercer essa paternidade é assumindo o filho e tendo consciência da missão, que é cuidar da pessoa para ser alguém no mundo, obter autonomia e, posteriormente, também ser pai ou mãe.
São Mateus-ES