PAULO SALDAÑA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo Jair Bolsonaro (sem partido) elaborou questão do Enem 2020 que apontava como correta alternativa que dizia que mulher negra não quer alisar os cabelos porque teria “postura de imaturidade”.

Outra questão apontava que discriminação racial em sistemas de inteligência artificial, como buscas do Google, estaria relacionado à linguagem e não ao preconceito.

O gabarito oficial foi alterado nesta quinta-feira (28), para mudar a resposta dessas duas questões. Isso ocorreu somente após questionamentos sobre racismo nas redes sociais.

Uma das pergunta (disciplina de inglês da prova de Linguagens) trouxe um texto da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. No excerto, uma cabeleireira e uma cliente conversam sobre alisar o cabelo, proposta que a cliente refuta por argumentar que gosta do seu cabelo natural, “como Deus o fez”.

O enunciado da questão pedia que o candidato indicasse quais argumentos sustentavam o posicionamento da cliente. Na primeira versão do gabarito oficial, a alternativa correta era a D: “demonstram uma postura de imaturidade”.

O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), que organiza o Enem, divulgou a correção no fim da manhã desta quinta. A alternativa correta passou a ser a C: “revelam uma atitude de resistência”.

Na outra questão, também na prova de Linguagens, o texto de apoio cita exemplo de software de entrevistas que excluía candidatos negros e buscas do Google que mostram anúncios de checagem de antecedentes criminais quando são digitados nomes comuns entre negros.

O primeiro gabarito indicava que o cenário tinha relação com a “linguagem”, na alternativa C. Com a correção do Inep, a resposta correta passou a D: “preconceito”.

As questões são a 5 e 43, respectivamente, na prova azul.

Questionado pela reportagem, o Inep não respondeu até a publicação deste texto. O órgão argumentou ao portal G1 que houve um erro: “a autarquia verificou que uma modificação feita no gabarito após o retorno das provas para o Inep não foi salva no banco de dados”.

“Como se o #EnemdaExclusão não tivesse problemas o suficiente, agora os gabaritos oficiais das provas apresentam erros, contradições e vejam só…racismo. Já bradava Chico César: “Respeitem meus cabelos, brancos!””, publicou nas redes sociais a vereadora de Belo Horizonte Macaé Evaristo (PT), ex-secretária de Diversidade e Inclusão do MEC, subpasta extinta pelo atual governo.

Em 2019, no primeiro ano do governo Bolsonaro, o Inep criou uma comissão para censura ideológica de temas no banco de itens, que agrupa as questões usadas nos exames federais. O Inep nunca divulgou quais temas e questões foram barrados.

A criação da comissão veio a pedido de Bolsonaro, que antes acumula críticas, de teor ideológico, sobre questões do Enem. As duas edições do exame a cargo deste governo deixaram de contar, de forma inédita, com perguntas sobre a ditadura militar no Brasil (1964-1985), período marcado por restrições civis e tortura, mas elogiado e defendido por Bolsonaro e apoiadores.

Bolsonaro tem um discurso de minimização do racismo, problema que ele já disse que não existe no país.

O presidente também havia criticado uma questão desta última edição do Enem. O item comparava os salários dos jogadores Marta e Neymar. A falta foi dita a apoiadores em meio à pressão por causa do fracasso federal no enfrentamento da pandemia.

O responsável pela diretoria que elaborou o Enem era até o início de janeiro um militar. O general Carlos Roberto Pinto de Souza era o titular da Diretoria de Avaliação de Educação Básica desde 2019 mas faleceu no último dia 11 por complicações da Covid.

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