As reflexões lançadas pela assistente social Rosimar de Oliveira Silva sobre o tema Consciência Negra na tribuna popular da Câmara Municipal emocionaram a vereadora Ciety Cerqueira. “É preciso que o Brasil respeite [o negro].

Tem que pedir perdão por tanta escravidão” – disse Ciety, que justificou a ausência na sessão legislativa do dia 16 por ter contraído a covid-19, que exige isolamento social. A vereadora foi a autora do requerimento para que Rosimar abordasse a resistência do povo negro em São Mateus e no Brasil, na sessão da última terça, dia 23.

Professora da Faculdade Vale do Cricaré e uma das fundadoras do Coletivo Constância D’Angola, Rosimar iniciou sua fala lembrando vítimas da escravidão e também líderes do povo negro: do passado, como Zumbi dos Palmares, Dandara, Zacimba Gaba e Constância D’Angola; e do presente, como Olindina Serafim, Selma Dealdina e outros integrantes do Coletivo Constância D’Angola. E citou ainda o extermínio dos povos indígenas que habitavam a região norte capixaba.

Com um discurso contundente, Rosimar buscou expressar o sofrimento dos negros trazidos da África para trabalhar como escravos em São Mateus e no Estado do Espírito Santo. “Chegaram aqui, através de sequestros e da violência física, vindos principalmente de Angola”, frisou. “Nem os melhores livros de história são capazes de retratar o tamanho da dor e da violência que o povo preto passou durante a sua travessia ou pela diáspora africana”.

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De acordo com a assistente social, estima-se que foram quase 1,8 milhão pessoas que, durante sistematicamente 350 anos, foram atiradas ao oceano, sendo 14 pessoas por dia. “Pra quê? Pra alguém obter lucro. Era assim que tratavam os negros africanos: como se fossem mercadorias” – completou.

Ela enfatizou que o tráfico de escravos sustentou a economia mateense por um período. “Um dos maiores itens lucrativos comercializados neste Município foram os corpos negros, mais do que o café e a cana-de-açúcar”. E acrescentou que, no litoral brasileiro, foi em São Mateus que atracou o último navio negreiro clandestino.

Rosimar disse que os negros são quase 70% da população do Município e que ainda assim enfrentam preconceito e racismo. “Não somos fantasias e não vamos aceitar mais apagamentos”. Ela enfatizou que os negros amargam os piores índices educacionais e de atendimento no sistema de saúde, sendo maioria também entre os afetados pelo déficit habitacional e entre os que perambulam pelas ruas, além de engrossarem as listas das mulheres e das crianças que mais sofrem violência.

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A assistente social ainda pontuou que os profissionais negros têm os menores salários e sofrem mais com o desemprego. “Racismo mata, racismo silencia, racismo estupra, racismo anula, racismo aniquila”, frisou.
Por fim, propôs que cada um que ouviu o pronunciamento dela fizesse a seguinte reflexão: “O que estou fazendo, no lugar que eu ocupo, para que tudo isso acabe?”.

 

EMOÇÃO ENTRE OS VEREADORES

Além de Ciety Cerqueira, outros vereadores manifestaram a emoção que sentiram quando ouviram relatos inquietantes sobre a realidade do povo negro no passado e no presente. Robertinho de Assis ressaltou que na Câmara Municipal há cinco vereadores negros e lembrou que é sobrinho da saudosa líder negra Cornélia Conceição, falecida em 2002, precursora, entre outras, das lutas das lavadeiras e empregadas domésticas nos anos 1980 em São Mateus.

Delermano Suim, por sua vez, revelou que a vó paterna dele chamava-se Constância e era descendente de escravos. E criticou o racismo: “Para Deus não tem distinção de cor, todos somos iguais”.

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O vice-presidente Kacio Mendes acrescentou que conhecia a família de Rosimar, lembrando que conhecia o irmão e os pais. “Parabenizo esta educadora, que virou orgulho nosso”.
A primeira-secretária Ciety Cerqueira foi determinado na condenação à discriminação racial e cobrou reparações ao povo negro.

“A quantidade de negros e negras que estão morrendo no nosso Brasil é insuportável”, cravou. “É preciso que os quilombolas se encontrem com a terra-mãe e tenham garantidos todos os seus direitos. Que sejam devolvidas as suas terras! Abaixar a cabeça, jamais” – disse a vereadora.

Ao relatar a recuperação do contágio pela covid-19, que afetou também a nora, Ciety lembrou que, como estava vacinada, teve apenas sintomas leves. Por isso conclamou a todos a buscarem as vacinas e a manterem os cuidados recomendados pelas autoridades médicas.

 

Foto do destaque: Divulgação

1 COMENTÁRIO

  1. Tem toda razão do mundo a professora Rosimar de Oliveira Silva.

    “Racismo mata, silencia, aniquila”

    O racismo é um vício social abominável, arraigado em nossa cultura desde os tempos do Brasil Colônia.

    Infelizmente, a nossa sociedade é predominantemente racista, sendo o Brasil um dos países onde mais se verifica violência contra negros no mundo, sobretudo jovens.

    De acordo com a “ONU Mulheres Brasil” (entidade das Nações Unidas para o Empoderamento da Mulher), “a cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado no Brasil. São 63 mortes por dia. 23 mil por ano.”
    [FONTE: http://www.onumulheres.org.br/noticias/23-mil-jovens-negros-assassinados-por-ano-e-um-escandalo-diz-nadine-gasman-representante-da-onu-mulheres ]

    Ou seja, um verdadeiro genocídio da juventude negra ocorre em nosso país e apesar de nos causar revolta e comoção, os assassinatos brutais de jovens negros que vemos quase todos os dias nos noticiários, tem sido infelizmente uma prática comum e recorrente no mundo inteiro.

    O preconceito racial não é um sentimento que brota de repente, da noite para o dia. Ninguém nasce racista !!

    O racismo, como todas as demais formas de preconceito, é produto de um aprendizado que tem suas raízes, muitas vezes, no seio da própria família. Lamentavelmente !!

    Já dizia Nelson Mandela, considerado um dos maiores símbolos da luta contra a segregação racial no mundo: “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, ou por sua origem, ou sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se elas aprendem a odiar, podem ser ensinadas a amar”.

    Os que alimentam essa insana ilusão de superioridade racial em relação aos negros deveriam lembrar, antes de tudo, que somos todos produto de semelhante genética e filhos de um mesmo Deus, e nesse sentido não podemos negar que somos todos irmãos.

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