MARCUS ALVES
LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – Quando Edimar chegou ao Braga (POR), em 2009, foi levado a uma sala por Jorge Jesus, que mostrou uma tela ao jogador brasileiro. Para a surpresa do lateral com passagens por São Paulo e Cruzeiro, lhe foi apresentado um vídeo de uma atuação sua pelo Tupi-MG contra o Atlético-MG na semifinal do Campeonato Mineiro que ele havia disputado.
O técnico, então, contou que tinha assistido ao jogo pelo PFC, canal pago do Grupo Globo, e decidido correr atrás de sua contratação em seguida. Não foi um caso único.
Em sua casa na região da Costa da Caparica, próxima a Lisboa, o comandante do Flamengo tem um estúdio com diversas televisões espalhadas. Elas estão quase sempre sintonizadas no serviço de pay-per-view do Brasileiro.
Esse interesse, no entanto, não era compartilhado da mesma forma por seus compatriotas. A última emissora portuguesa a comprar os direitos do Campeonato Brasileiro, a SIC Radical, preferiu não transmiti-lo em 2018 por falta de audiência.
Existe um antes e depois, contudo, nessa história. Ele foi desencadeado pela loucura que assola os portugueses desde a ida de Jorge Jesus para o Flamengo.
Com o sucesso do “Mister” no Brasil, seus passos têm sido contados diariamente em uma cobertura ampla no noticiário local. Não é difícil se deparar com o esquema tático rubro-negro sendo destrinchado em horário nobre nas emissoras do país. Há até comentaristas discutindo em debates na televisão com o uniforme do clube carioca.
Ficou mais fácil ver os jogos do Flamengo também. Três emissoras diferentes passaram jogos da equipe em Portugal. A CMTV transmitiu a estreia de Jesus em amistoso com o Madureira, o Sport TV (canal português homônimo da emissora brasileira) exibiu toda a campanha na Copa Libertadores e o Canal 11 mostrou os jogos do Brasileiro. Agora será a vez da RTP transmitir o Mundial de Clubes.
“O que justifica isso é o impacto que ele tem aqui. Existe interesse do público em saber o que se passa com Jesus”, afirma Irene Palma, repórter de A Bola TV, que já foi enviada mais de uma vez ao Rio de Janeiro para fazer reportagens sobre o técnico.
“Nunca houve um interesse tão grande no futebol do Brasil como agora. Antes de Jesus, a maioria não sabia o nome de três jogadores do Flamengo. Havia preconceito com o futebol brasileiro porque as pessoas não gostavam muito do estilo, achavam desorganizado”, comenta Duarte Tornesi, repórter do jornal O Jogo. “É por ele estar lá que as pessoas passaram a assistir. Acredito que Jesus tenha apresentado um admirável mundo novo aos portugueses”, completa.
Essa obsessão pelo técnico foi um dos fatores que motivou o Canal 11, que pertence à Federação Portuguesa de Futebol, a fechar acordos pontuais com o Flamengo e seus adversários para mostrar as partidas do Brasileiro.
No total, foram 15 jogos transmitidos entre setembro e dezembro. Somente Palmeiras e Santos se negaram a vender seus direitos, o que impossibilitou a exibição dos jogos.
A aposta da emissora se mostrou acertada. Na TV paga, os confrontos do time carioca estiveram invariavelmente entre as maiores audiências do país, com destaque para a vitória de 1 a 0 sobre o Grêmio, em 17 de novembro. Segundo dados do site Meios & Publicidade, ficou na vice-liderança daquela semana, com 219 mil telespectadores.
“Foi muito bom. Nunca tinham ligado muito para a Libertadores. Pouca gente parou para ver Boca Juniors e River Plate no ano passado. Qual foi a final antes disso? Ninguém se lembra”, afirma o jornalista Pedro Sousa, apresentador do Canal 11.
“Mas creio que o Brasil tem que se abrir mais para o mundo. Não sei se as pessoas têm muito essa noção, os seus próprios dirigentes, de que não estão sendo vistos em outros lugares”, completa.
Um atestado da força do técnico em Portugal é que, mesmo do outro lado do oceano, a sua sombra segue incomodando alguns treinadores do país.
No fim de outubro, ao escutar pergunta sobre uma suposta pressão para vê-lo substituído por Jorge Jesus, o técnico do Porto, Sérgio Conceição, sorriu, se levantou e abandonou coletiva.
Bruno Lage, treinador do Benfica, passou por situação semelhante antes de partida da Champions League e não escondeu a sua indignação.
A onipresença do técnico tricampeão português na imprensa local não surpreende.
Se por um lado ele se mostra a par do que existe de mais moderno em termos de treinamento de suas equipes, por outro, mantém também uma faceta mais antiga em seu relacionamento com a imprensa. Não teve assessor durante boa parte de sua carreira e intermediava ele próprio convites para entrevistas.
“Não tenha dúvida de que essa autêntica loucura que se viu na cobertura do Flamengo foi potencializada por ele na relação estreita que possui com jornalistas do país”, afirma Tornesi.
Uma cena comum no Rio é vê-lo jantando em restaurantes com profissionais enviados para cobrir a sua rotina.
“Existe uma relação de respeito. O português tem muito isso. Quando está fora do país, acolhe em sua casa como se fosse a deles. É um pouco naquela de receber bem quem veio ter comigo”, descreve Irene, que diz ter acompanhado o primeiro treino de Jesus, há 20 anos, ainda no modesto Estrela da Amadora.
Foi um longo percurso para o técnico, que agora curte a fama enquanto embala o sonho de reconduzir o Flamengo ao título mundial no Qatar.

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