“Não tem sido fácil, os dias estão bem pesados”. Esta é avaliação da escritora Mônica Porto sobre a situação de isolamento doméstico como prevenção ao novo coronavírus. Com dificuldade de inspiração para a produção literária, a moradora do Bairro Porto relata que procurou focar na oração neste momento de distanciamento social.
“A maioria das pessoas procurou se voltar para a Deus porque é a única solução que a gente consegue imaginar, devido a grandeza do problema que estamos vivendo no Mundo”, entende Mônica.
Aos 47 anos, acostumada a escrever e à fácil inspiração, Mônica relata que ficou duas semanas sem conseguir produzir uma linha. “Depois destas duas semanas, escrevi um texto que é sobre coronavírus, totalmente fora do assunto em que estou trabalhando”, relata. Intitulado Dias vorazes, o texto está publicado abaixo, apresentado pela escritora para os leitores da Rede TC.
Em casa com o esposo Rafael e a filha Mahana, de sete anos, Mônica tem procurado melhorar a sensação no ambiente doméstico, lendo livros, telefonando para amigos e familiares para saber como estão e se precisam de alguma coisa, além, é claro, de brincar com a filha e cumprimentar de longe os vizinhos. O filho Malcolm trabalha em Linhares.
Aniversário atípico
A escritora Mônica Porto completou 47 anos no dia 28 de março e o aniversário foi atípico, sem o carinho físico da família e de amigos. Mesmo assim, Mônica entende que o distanciamento social é importante neste momento em que o novo coronavírus avança.
“Eu li uma frase muito interessante: ‘Se acontecerem menos casos, esse isolamento vai aparecer besteira, mas a ciência não quer glamour, quer eficácia’. Provavelmente, vamos falar que poderia ter sido feito as coisas normais. Ainda que tenhamos consequências econômicas, que com certeza preocupam a todos, claro, acredito que isolamento é muito necessário agora” – reforça.
TEXTO DE ESCRITORA
Dias vorazes (Por Mônica Porto)
Caminha por entre as gentes do mundo inteiro
Um ser minúsculo, invisível e desordeiro.
Capaz de grandes feitos.
De encher de morte muitos leitos.
E como um rastilho de pólvora,
persegue gente velha, gente nova,
Sem respeitar fronteiras
Ou classes sociais.
Sem escolher a cor da pele ou de quanto dinheiro se tem na conta.
Se são iletrados, estudados ou imortais.
Não lhe importa a religião ou o partido político,
Time de futebol ou o quanto viajou o mundo.
Essa pequena parcela de morte
Acomete gente de toda a sorte.
Devolve todos aos lares.
Faz conviver a família que mal se conhecia.
Perceber que tem o dinheiro, mas nada pode comprar.
Que seus bens materiais não poderá ostentar.
A princípio é escuridão,
Falta de sorte.
Mas, pensando bem, o que é a morte?
Final dessa vida ou começo de outra?
O que é um vírus perante a fome ou o genocídio?
A lama, o sal, nos mares, nos rios.
O fogo lambendo as florestas deixando seu rastro de morte.
Mulheres perseguidas, envergonhadas,
Estendidas no frio chão de seu próprio lar,
nas ruas, em qualquer lugar.
Jovens de periferia assassinados a sangue frio.
Mães que choram os seus filhos sem entender o que é que há.
O vírus só tem mais pressa.
Urgência em fazer mudanças.
Quem sabe esse ser, minúsculo, invisível e desordeiro
Traga ao íntimo de cada um a Nova Ordem Mundial?
Caminha pelas ruas do mundo
E não mais encontra no caminho quem procura.
Prisioneiros de seus medos,
Isolados, em segredo,
Esperando que a morte esteja atarefada demais
Para os encontrar.
Silêncio na ‘Cidade-Luz’.
Terror no ‘Coração Financeiro’.
Um ‘Adeus’ ecoa na alma humana
De quem não pode nem velar os seus.
No ‘Antigo Império Romano’
O último réquiem nas varandas.
Que minúscula partícula de morte
Pode ser tão poderosa e controversa?
Que verdade estranha é essa
Que não conseguimos enxergar?
De tempos em tempos,
Eis que surge essa fagulha de medo a silenciar,
Fazer pensar,
Refletir a humanidade.
E, quem sabe,
Quem sabe o que mudará?