NICOLA PAMPLONA
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Ao mesmo tempo em que enfrenta impactos financeiros da pior crise, a indústria do petróleo tenta reduzir riscos à saúde dos trabalhadores que mantêm as instalações em operação. Algumas mudanças implantadas até o momento, porém, vêm gerando resistências.

Entre as medidas, estão a redução de contingentes em plataformas e refinarias e a ampliação dos turnos de trabalho. A Petrobras chegou a implantar um período de isolamento prévio em hotéis para avaliação dos que vão embarcar, mas a medida foi suspensa.

As maiores dificuldades estão relacionadas às plataformas em alto-mar, tipo de operação naturalmente confinada e que depende de complexo esquema logístico para levar os trabalhadores de todo o país a aeroportos de onde saem os helicópteros.

O IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo, que reúne as petroleiras) criou um comitê de crise para compartilhar melhores práticas e desenvolver procedimentos para reduzir os riscos. “É tudo novo para todo o mundo”, diz a presidente da entidade, Clarissa Lins.

Segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o Brasil tem 103 plataformas de produção de petróleo em operação, 91 delas pela Petrobras. Algumas, localizadas a mais de 200 quilômetros da costa.

A primeira medida adotada pela estatal para reduzir o risco de contágio foi aferir a temperatura dos trabalhadores antes do embarque. Depois, ampliou o período embarcado para 28 dias, dos quais 7 deveriam ser em hotéis sob acompanhamento médico.
Com períodos de embarque mais longos, dizem as empresas do setor, há menos trocas de tripulação nas unidades. “Quanto mais tempo fica uma tripulação não contaminada, mais ela está preservada”, afirma a presidente do IBP.

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As medidas, porém, geraram críticas. “Imagina um trabalhador ficar enclausurado sete dias dentro de um hotel. Vai embarcar emocionalmente abalado”, diz o presidente da FUP (Federação Única dos Petroleiros), José Maria Rangel.

Agora, diz a Petrobras, os sete dias de isolamento prévio devem ser cumpridos em casa, sob acompanhamento de médicos da estatal, que checam o estado do trabalhador e reforçam as orientações recomendadas pelas autoridades.

Para aumentar a segurança, os sindicatos pedem testes em todos os empregados que serão embarcados. A empresa diz testar casos suspeitos. Todos os que apresentam os sintomas são desembarcados o mais rápido possível.

Até o momento, não há confirmação de casos de Covid-19 em suas plataformas. Entre os dias 21 e 22 de março, a empresa desembarcou oito pessoas com sintomas de gripe de uma unidade, mas os resultados não foram divulgados.

As dificuldades, porém, vão além da etapa de embarque. Com a redução no número de voos pelo país e restrições nas estradas, trabalhadores reclamam das dificuldades para chegar aos aeroportos de onde saem os helicópteros –os de maior movimento estão no litoral norte do Rio de Janeiro.

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A prefeitura de Macaé (RJ), onde está uma das principais bases de apoio às plataformas, limitou o acesso à cidade, com barreiras na principal estrada para fiscalizar o tráfego de pessoas e equipamentos.

Lins, do IBP, diz que a as restrições ao tráfego foram um dos desafios no início da crise, mas que a questão foi resolvida com a inclusão do setor entre os serviços essenciais. O setor teme, porém, pressões para aumento da arrecadação ou mudanças regulatórias.

A pandemia do coronavírus pegou a indústria de petróleo já em meio a forte crise, provocada pela redução das cotações internacionais após divergências entre grandes exportadores sobre cortes na produção global. Para Linz, do IBP, uma “dupla crise de dimensões sem precedentes”.

Com a pandemia, o excesso de oferta do óleo foi agravado por um choque de demanda. Com previsões de queda de até 20% no consumo, as cotações despencaram aos menores níveis desde o início dos anos 2000, iniciando uma onda de cortes de investimento pelo mundo.

Levantamento do IBP aponta que sete grandes empresas, incluindo a Petrobras, cortaram em 20% o total de investimentos previstos antes da crise. A brasileira reduziu sua projeção para 2020 em 30%, para US$ 8,5 bilhões (R$ 45 bilhões).

A companhia anunciou cortes de sua produção de petróleo em 200 mil barris por dia, fechando campos menos rentáveis, para evitar gargalos no sistema de armazenamento, problema que o excesso de oferta global começa a gerar.

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Na quinta-feira (2), o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse que a busca por navios para armazenar petróleo sem compradores já elevou o custo dos fretes para a China de US$ 3 (R$ 16) para US$ 11 (R$ 59) por barril.
A produção das refinarias também está sendo reduzida, já que não há demanda para produtos como gasolina e querosene de aviação.

A crise chegou em um momento de retomada da atividade petrolífera no país, que esperava os investimentos de empresas estrangeiras que adquiriram blocos exploratórios nos diversos leilões realizados desde o governo de Michel Temer.

O vice-presidente do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais) e ex-diretor da Petrobras, Jorge Camargo, vê um achatamento na curva de investimentos diante dos problemas de caixa das empresas. “Os projetos continuam economicamente viáveis, mas vão valer menos.”

Pequenas petroleiras que também investiram em leilões ou em áreas vendidas pela Petrobras pedem ao governo redução nas alíquotas de royalties para sobreviver. O setor tem produção pequena, de cerca de 10 mil barris por dia, mas emprega 12 mil pessoas.
“Seria um impacto mínimo nas contas do Tesouro mas com grande relevância social”, defende o secretário-executivo da Abpip (Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo), Anabal dos Santos Junior.

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