LUCIANO TRINDADE E FERNANDA CANOFRE
SÃO PAULO, SP E BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – Em 2020, no seu 99º ano de existência, o Cruzeiro disputará a Série B do Brasileiro pela primeira vez em sua história. Neste domingo (6), com a derrota por 2 a 0 para o Palmeiras, no Mineirão, o time de Belo Horizonte foi rebaixado da elite do futebol nacional. Não faltaram problemas técnicos, políticos e financeiros na temporada do clube mineiro.
Salários atrasados, jogadores afastados, quatro técnicos diferentes durante a competição, além de uma investigação policial envolvendo membros da diretoria são alguns dos principais componentes da pior crise da história do clube.
Em 38 rodadas do Brasileiro, o Cruzeiro venceu sete partidas. Fechou a competição com 39 pontos, seu pior aproveitamento na era dos pontos corridos com 20 times –desde 2006. A pior marca, até então, era a de 2011, quando ficou em 16º, última posição antes da parte vermelha da tabela, com 43.
O fracasso pode marcar o fim de uma geração que conquistou títulos no clube, as Copas do Brasil de 2017 e 2018. Casos, por exemplo, de Fábio, Léo, Henrique, Robinho. Destaque nessas conquistas, Thiago Neves foi afastado pelo clube.
Durante a temporada atual, os jogadores do time conviveram com atrasos de pagamento. A inadimplência é um reflexo do aumento da dívida do clube.
De acordo com levantamento do Itaú BBVA, entre 2017 e 2018, a equipe viu sua dívida crescer 41%, saltando de R$ 333 milhões para R$ 469 milhões. Como gastou mais do que conseguiu gerar em seu caixa, fechou o ano passado com déficit de R$ 70 milhões.
O Cruzeiro lidera o ranking dos times da Série A que contraíram novas dívidas com a União desde 2016, após o Profut –programa de refinanciamento dos débitos dos clubes com o governo federal. Foram R$ 17 milhões em débitos.
Um relatório técnico feito pela Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados apontou que a equipe celeste levaria 200 anos para quitar suas dívidas. A conclusão leva em conta a soma dos débitos, a origem deles e como é a gestão do clube.

Com vitória de 2 a 0, o Palmeiras rebaixou o Cruzeiro, no Estádio Mineirão. -Foto: Cesar Greco-Agência Palmeiras/Divulgação

No ano da queda, a administração cruzeirense virou caso de polícia. Uma reportagem veiculada em maio pelo Fantástico, da TV Globo, apontou transições irregulares e uso de empresas de fachada em negócios do clube.
Uma das figuras centrais era o então vice-presidente de futebol Itair Machado. Na época da campanha para a presidência, o atual mandatário, Wagner Pires de Sá, havia se comprometido com apoiadores que Machado não faria parte da diretoria, segundo fontes ouvidas pela reportagem.
Itair foi afastado do cargo, no meio do ano, depois que um grupo de conselheiros fez o pedido na Justiça alegando que os processos trabalhistas que corriam contra ele o impediam de permanecer na gestão pelo estatuto do clube.
Em outubro, o conselho deliberativo, presidido pelo ex-senador Zezé Perella, convocou uma reunião extraordinária para deliberar sobre o pedido de afastamento de Wagner Pires de Sá e dois vice-presidentes, Hermínio Francisco Lemos e Ronaldo Granata. Antes do encontro, Itair deixou o cargo e Perrella assumiu a gestão do futebol em seu lugar.
À frente do futebol, Perrella foi o responsável pelo afastamento de Thiago Neves, 34. O meia foi sacado do elenco por ter sido flagrado em uma festa no Mineirão, no dia 1º de dezembro, um dia antes de o time jogar contra o Vasco. O atleta estava machucado e já não atuaria na partida.
“Comemorando o quê?”, questionou o dirigente, em vídeo publicado na internet, referindo-se ao meia. O cartola disse ainda que o clube vai cumprir o contrato do jogador, mas que ele treinaria à parte.
No Cruzeiro desde 2017, com atuações importantes no bicampeonato da Copa do Brasil, Neves recebe o quarto maior salário do elenco em CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), atrás de Fred, 36, Fábio, 39, e Edilson, 33.
O jogador fatura R$ 480 mil em carteira. Ele ganha ainda direitos de imagem, em valores não revelados.
Relatório de uma sindicância interna mostra que o gasto com elenco passou de R$ 12,7 milhões no fim de 2017 para R$ 20,2 milhões em abril deste ano. O documento também aponta inconsistências nas finanças do clube, como pagamento de intermediário para renovar acordos com atletas do próprio elenco e contratos inativos que ainda recebem pagamentos.
A venda do uruguaio De Arrascaeta para o Flamengo por cerca de R$ 55 milhões também é citada na investigação. A saída do meia ocorreu em janeiro deste ano, mas os valores foram lançados no balanço de 2018.
Um inquérito foi aberto pela Polícia Civil de Minas Gerais para apurar desvios de recursos e crimes de falsidade ideológica e falsificação de documentos. A Promotoria também investiga o clube.
Para sair desta crise, o Cruzeiro vai ter de lidar com uma queda de receitas em 2020. A redução será na arrecadação com a venda dos direitos de TV para a transmissão das partidas do Brasileiro.
A partir deste ano, as cotas da TV aberta foram divididas da seguinte maneira: dos R$ 600 milhões pagos pela Rede Globo, dona dos direitos, 40% é dividido igualmente, 30% é partilhado pelo número de transmissões e 30% é pago de acordo com a classificação no torneio, do 1º ao 16º.
O Cruzeiro recebeu sua porcentagem dos 40%, R$ 12 milhões, mas não terá nada a ganhar por ter ficado abaixo do 16º. Com 11 jogos exibidos em TV aberta, o clube embolsará mais R$ 10 milhões.
A Série B deste ano não teve transmissão em TV aberta. Pelos jogos exibidos na TV fechada, no canal SporTV, do Grupo Globo, cada clube recebeu igualmente cerca de R$ 6 milhões, independentemente do número de partidas.
Há, ainda, valores referentes ao jogos transmitidos pelo Premiere. Na Série A deste ano, a Globo prevê distribuir aos clubes 38% do que arrecadar com a venda do serviço. O montante ainda não foi fechado. O clube com mais torcedores assinantes receberá mais. Há um valor mínimo a ser pago por contrato e este varia por clube.

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