JOELMIR TAVARES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ex-ministro Ciro Gomes (PDT) intensificou os acenos a siglas como DEM e PSD para viabilizar sua candidatura à Presidência em 2022 e, em entrevista à Folha, defendeu uma união de centro-esquerda para derrotar Jair Bolsonaro (sem partido) e reforçou seu rompimento com o PT.

“Nesse quadro de hiperfragmentação, quem for contra o Bolsonaro no segundo turno tem tendência de ganhar a eleição. O menos capaz disso é o PT. Por isso, a minha tarefa é necessariamente derrotar o PT no primeiro turno”, afirma.

Ciro, 63 –que disputou o Planalto três vezes e terminou em terceiro lugar no pleito de 2018, com 13 milhões de votos (12% dos válidos)– escancarou seu distanciamento da sigla ao não embarcar na campanha de Fernando Haddad (PT) no segundo turno daquele ano, vencido por Bolsonaro.

Ex-ministro do governo Lula (PT), o pedetista diz que o que chama de “lulopetismo” representa hoje uma “adversidade intransponível” em sua relação com a legenda.
“Converso muito com os petistas. Lá dentro, tem um grupo que acha que o Lula, com sua loucura e caudilhismo, está passando de qualquer limite. Faz as coisas sem consultar ninguém, joga só, é o Pelé”, compara.

“O Lula escolheu o Haddad [como pré-candidato em 2022] porque não fará sombra a ele nem hoje nem jamais. Ou seja, quer replicar a escolha da Dilma [Rousseff].”

Ciro e Lula sentaram para um papo em setembro do ano passado e colocaram em pratos limpos questões da atribulada relação, mas uma reconciliação, desejada por setores da esquerda, não avançou.

“Nós [PT e eu] somos coisas diferentes. Fomos aliados em alguns momentos e adversários em outros. Eu agora tenho uma adversidade intransponível com o lulopetismo, que é diferente dos outros ‘PTs’ que eu conheço”, afirma.

Entre seus interlocutores no partido de Lula estão o governador do Ceará (berço político dos Gomes), Camilo Santana, e o senador pela Bahia Jaques Wagner.

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Repetindo o mantra de que “o Brasil precisa de uma amplíssima união de centro-esquerda”, o pedetista estreitou laços com os presidentes nacionais do DEM, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto, e do PSD, o ex-ministro Gilberto Kassab, de olho em alianças.

O PDT, que em 2018 concorreu ao Planalto coligado apenas com o nanico Avante, trabalha também para repetir na disputa eleitoral o bloco que formou com PSB, PV e Rede Sustentabilidade, atuante na oposição a Bolsonaro no Congresso.

Nas eleições municipais de 2020, a dobradinha PDT-PSB saiu vencedora em três capitais de estados do Nordeste (Fortaleza, Recife e Maceió). O partido de Ciro ainda compôs chapas vitoriosas em Aracaju (com PSD, entre outros, na coligação), Salvador (com DEM) e Natal (com PSDB).

Agora, o presidenciável se apega aos resultados para montar o arranjo da candidatura nacional. Calejado pela prática de quase 40 anos de carreira política, diz que a fase de conversas exige paciência e não envolve, por enquanto, acordos e indicações para a vaga de vice.

“Quero sinalizar minha vontade de alargar o diálogo, porque o Brasil necessita de um novo consenso. E aí aparece o DEM, com todas as suas contradições internas e comigo, e o PSD, com contradições mais comigo do que internas. E daí? Quero que isso seja feito à luz do dia, de forma transparente.”

Oficialmente, nenhuma das duas legendas bateu martelo sobre 2022. Ambas mantêm contatos com outros pré-candidatos e caciques partidários.

Ciro evita nomear siglas almejadas ou vetadas em sua articulação. “No Brasil, o centro tem oscilado ciclicamente, conforme a agonia socioeconômica e a agenda político-institucional”, despista.

“Não tenho coragem de me propor a ser presidente do Brasil para governar sem um amplíssimo diálogo com as forças que me são diferentes. Busco alianças, desde que não sejam para roubalheira e loteamento de governo, mas, sim, à base de um plano de governo qualificado”, pontua.

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Ao mesmo tempo em que sai à procura de aliados, o presidenciável tem olhado para dentro de casa, montando palanques estaduais do PDT e atraindo quadros.

Segundo Ciro, o partido está com candidaturas próprias engatilhadas em dez estados, entre eles São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Ceará e Rio Grande do Norte. Em locais como Minas Gerais e Bahia, o PDT está acertando a presença em coligações.

Em São Paulo, a sigla quer filiar e lançar para o Palácio dos Bandeirantes o atual prefeito de Barueri, Rubens Furlan (hoje no PSDB). Em 2020, na disputa pela prefeitura da capital paulista, o PDT ocupou a vice de Márcio França (PSB), que é pré-candidato ao governo estadual.

A plataforma da candidatura presidencial de Ciro deverá seguir a trilha da apresentada em 2018, ancorada na retomada econômica e em um projeto nacional desenvolvimentista. Um dos desafios que se impõem para o grupo é o de traduzir as propostas para o eleitor.

Em linhas gerais, ele tem em mente um governo que nem estigmatize nem superdimensione o papel do Estado e a influência do mercado. “O Brasil está em fim de ciclo. Faz uma década que não crescemos nada”, afirma o pedetista. “O que funciona é um sistema misto, com o Estado na ativação da economia.”

“Nunca foi tarefa do mercado promover o desenvolvimento, nem é justo que se exija dele isso. Solto, ele produz inequidade e crise, mas ele é uma ferramenta indispensável ao progresso, e isso é algo que a esquerda antiga não entende.”

Alas da nova esquerda afeitas a pautas como a luta antirracista, a igualdade de gêneros e a diversidade sexual também não escapam às críticas do presidenciável. Em nome do voto do eleitorado médio, cansado dos governos recentes, Ciro sinaliza um afastamento de certos debates ideológicos.

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“O Brasil não cabe num gueto de esquerda. O Brasil é grande demais, complexo demais. Especialmente se a gente entender que esquerda é esse identitarismo, que não duvido que é de boa-fé, mas que não consulta nada da vida real do povo, da moral popular, da religiosidade. E eu respeito tudo isso.”

Nos flertes com líderes partidários, ele tem marcado sua posição anti-Bolsonaro e anti-Lula e desestimulado apostas em neófitos como o ex-juiz Sergio Moro e o apresentador Luciano Huck (ambos sem filiação partidária), aos quais faz ataques pela inexperiência.

Outros raciocínios que ele usa a seu favor são a baixa popularidade de Bolsonaro e a derrocada do PT nas eleições municipais –o partido ficou sem eleger prefeitos em capitais pela primeira vez desde 1985 e amargou vexames como o 6º lugar de Jilmar Tatto em São Paulo.

“Há pesquisas mostrando repúdio à continuidade do Bolsonaro e apoio à existência de uma opção a ele e a Lula. Como alguém que está acumulando 70% de rejeição vai se reeleger?”, diz. Segundo pesquisa Datafolha de janeiro, o governo do presidente é considerado ótimo ou bom por 31% da população.

Em seus giros, Ciro também tem difundido a narrativa de que é o único postulante com consenso e estabilidade em seu partido. Ele alfineta o governador João Doria (SP), que enfrenta um PSDB rachado, e Haddad, que foi lançado pelo PT, mas já afirmou que, caso Lula possa concorrer, terá o apoio dele.

“Meu partido me quer, não tem contestação lá dentro, eu parto de um patamar de 12% a 15% em qualquer levantamento e estou aberto para conversar pra cá, pra lá”, valoriza o pré-candidato, a caminho de sua quarta tentativa de virar presidente da República.

FOTO DE DESTAQUE: Pedro Ladeira/Folhapress

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