Muita gente se queixa dos tempos em que vivemos. Parece que não há mais fraternidade: isto nos acabrunha e perturba. A sociedade está em demanda de uma convivência mais humana, livre e fraterna. A injusta distribuição da renda está na origem do profundo desequilíbrio, que marca a nossa sociedade. Isto se reflete na posse da terra e do solo urbano: cenário de constantes conflitos e injustiças. O nosso sistema neoliberal torna difícil o emprego, o aluguel, até de um pequeno cômodo, caro demais; água, luz e gás nem se fala, e pouco sobra para a compra da comida!

Quem sofre mais são as crianças, desnutridas e doentias.  O egoísmo e a cobiça, gerando uma escandalosa desigualdade social, acabam por desrespeitar as mais elementares exigências de justiça e de solidariedade humana. Como entender que o Brasil seja o quarto maior produtor de alimentos e detentor do segundo rebanho mundial e, ao mesmo tempo, seja um dos países com o maior índice de desnutrição? Esta fome é falta de comida ou de justiça? A estrutura e a organização da nossa sociedade precisam de uma nova Constituição! E esta mudança deve começar a partir do nosso coração! Mudança que se chama: conversão.

É a conversão que faz crescer em nós a fome de justiça e, esta fome, mata a outra: a fome de pão! Sem a conversão do coração, cada um vai continuar comendo sozinho o pão inteiro: “Para acabar com a fome de pão é preciso que cresça dentro de nós um outro tipo de fome: a fome e sede de justiça, a bem-aventurança evangélica, anunciada por Jesus” (Papa Francisco). O pão que falta ao irmão é a metade do pão que nós comemos cada dia. Para sentir fome e sede de justiça, precisamos nos converter a Deus: é ele que tem o poder de nos dar olhos novos, um novo espírito e um novo coração para amar e partilhar o que temos e ganhamos.

A Igreja está consciente de que nenhuma ideologia tem exigências mais radicais do que as que decorrem do Evangelho e que a superação da injustiça deve se realizar dentro de espaços democráticos, rejeitando qualquer tipo de regime autoritário ou ditatorial, pois a história demonstra que os “salvadores da pátria” acabaram por trair os seus povos. A sociedade precisa de se pensar e organizar como um país “livre e soberano, socialmente solidário, no qual ninguém fica para trás” (Papa Francisco).

O grau de civilização de um povo, de fato, não se mede pelo seu poder econômico, ou pela sua raça ou cultura, mas pelo valor que ele sabe dar a cada um de seus cidadãos, independentemente daquilo que ele tem, sabe ou produz. Isto postula uma sociedade solidária, onde os mais fracos têm precedência no atendimento às suas necessidades básicas. Assentado sobre os pilares da justiça e da solidariedade, como, também, sobre a valorização de suas variadas culturas e tradições espirituais, o Brasil vai se tornar um povo merecedor da felicidade do Evangelho: “Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados”.

 

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(*Padre Ernesto Ascione é missionário comboniano e vigário cooperador da paróquia São José, Serra-ES.)

 

Foto do destaque: Arquivo TC Digital

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